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A Imperfeição dos Indicadores de Desempenho - Parte 1

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A Imperfeição dos Indicadores de Desempenho - Parte 1

A Imperfeição dos Indicadores de Desempenho - Parte 1

A literatura reconhece que os indicadores de desempenho são utilizados para induzir comportamentos dos colaboradores para que estes envidem esforços para atingir os objetivos organizacionais determinados pelos acionistas. 

Uma crítica é que muitos desses objetivos organizacionais são excessivamente focados no desempenho de curto prazo, no que a literatura chama de short-termism ou ainda de miopia gerencial.

Outro aspecto é que há que se tomar cuidado na escolha dos indicadores de desempenho, pois eles podem gerar comportamentos disfuncionais, que são conceituados como “aqueles praticados em prol somente de interesses pessoais em detrimento dos organizacionais”. Outros comportamentos passam também pela manipulação dos indicadores por meio de uso discricionário de classificações contábeis ou de transações que afetam esses indicadores de forma intencional e não usual. O tema é extenso, portanto, nesse artigo vou me deter em dois aspectos: o momento da apuração e o problema da construção do indicador.

Cito aqui alguns exemplos relacionados com o momento em que o indicador é apurado: (1) o caso de passageiros de mau comportamento avaliando negativamente o desempenho da tripulação, que simplesmente foi enérgica com ele, recusando-se a servir mais uma bebida ou pedindo insistentemente para que ele se sentasse na hora da turbulência ou aguardasse a vez de descer; (2) o paciente que ficou descontente ao ter seu pedido de retirada de medicamento ou mesmo pedido de alta recusado pelo médico, mas que se mostrou ser uma decisão correta posteriormente; (3) o aluno que reclama sobre avaliação com o professor, mas que depois reconhece o quanto aprendeu no curso; (4) o cliente que esperava que o consultor legal validasse um procedimento que ele gostaria de fazer, mas que recebeu como uma resposta negativa e ficou contrariado e avaliou de forma negativa o consultor. As soluções passam por tentar medir a percepção dos clientes/pacientes/alunos em um momento posterior à execução do serviço, tentando estimar o tempo que os efeitos já teriam maturado e observar as avaliações que são muito diferentes, tanto as positivas como as negativas. 

Agora temos o problema da construção do indicador: (1) Muller (2018) relata o caso dos médicos que passaram a evitar cuidar de pacientes mais suscetíveis a óbito, pois o número de mortes pesava negativamente no seu desempenho (total de pacientes levados a óbito dividido pelo total de pacientes sob cuidados); (2) o retorno sobre o capital investido é um exemplo clássico. A rentabilidade ia bem até que se contabilizasse um grande investimento em equipamentos que, como ainda não tinham gerado receitas nem lucros, fez despencar a rentabilidade, pelo aumento do denominador; (3) o pessoal que trabalhava na área de faturamento e que postergava a emissão das notas fiscais para outro mês quando via que já tinha batido a meta mensal ou quando via que não iria bater mesmo; (4) o pessoal que “empurrava”/vendia seguro no final do mês para os amigos, já combinado que estes cancelariam no mês seguinte.

Certamente o leitor tem outros exemplos, mas todos eles podem ser corrigidos com pequenos ajustes. No caso 1, uma possível solução pode ser uma mudança no denominador, ajustando o número de pacientes cuidados considerando o risco de óbito já no início do tratamento, ou ainda mudando para uma avaliação qualitativa em termos de qualidade dos procedimentos executados. No caso 2, o remédio clássico é usar uma média móvel do denominador (Merchant & Van der Stede, 2012), ou então excluir ativos que ainda não estão em operação. No caso 3, a solução passaria também por média móvel, compensando as sobras e faltas de um mês com os meses seguintes. No caso 4, a solução passa por incluir os cancelamentos até com um fator punitivo no cálculo. 

Os indicadores de desempenho são imperfeitos (Chenhall, Hall & Smith, 2013) e vão continuar sendo imperfeitos, pouco mais ou pouco menos, mas o importante é que uma profunda reflexão seja feita. Elenco aqui algumas sugestões com base nos problemas que apresentei nesse artigo: 

- Revisar os indicadores de desempenho mais suscetíveis às imperfeições; uma dica é começar pelos indicadores das áreas e profissionais que estão batendo metas, mesmo quando a empresa está indo mal.
- Revisar os indicadores cujo numerador está descompassado no tempo com o denominador.
- Rever os indicadores cujos efeitos ainda não geraram os efeitos no momento em que são coletados (instantaneidade).
Como não esgotei o assunto, na próxima semana vou continuar discutindo esse tema. Se você tiver alguma sugestão e/ou crítica, por favor, escreva para mim no e-mail prof.oyadomari@gmail.com  Muito Obrigado. 

Referências:

Chenhall, R. H., Hall, M., & Smith, D. (2013). Performance measurement, modes of evaluation and the development of compromising accounts. Accounting, Organizations and Society, 38(4), 268–287. https://doi.org/10.1016/j.aos.2013.06.002
Merchant, K. A.; Van der Stede, W. A. (2012). Management control systems: performance measurement, evaluation, and incentives. (3rd ed.). London: Prentice Hall.
Muller, J. (2018). The Tyranny of Metrics. The Tyranny of Metrics. Princeton University Press. https://doi.org/10.23943/9781400889433

José Carlos Oyadomari é Professor Doutor em Controladoria, atua pelo Insper e Mackenzie. Consultor do MA Institute. Conselheiro da HVAR Consulting. Co-autor do livro Contabilidade Gerencial – Gen Editora. 
 

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