Brics vai condenar ataques contra o Irã, mas sem provocar Trump ou Israel
Negociadores conseguiram evitar linguagem mais dura proposta pelos iranianos

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Em declaração final, obtida pela Folha, da sua cúpula de líderes no Rio de Janeiro, o Brics condena os recentes ataques contra o Irã, mas não menciona nem Israel nem Estados Unidos, os países que bombardearam a nação persa.
"Condenamos os ataques militares contra a República Islâmica do Irã desde 13 de junho de 2025, que constituem uma violação do direito internacional e da Carta das Nações Unidas", diz o documento que deve ser divulgado neste domingo (6).
Após intensas discussões, os negociadores conseguiram evitar linguagem mais dura proposta pelos iranianos, com termos como "deploramos", considerados muito fortes no jargão diplomático. Mas o bloco aponta a "violação do direito internacional e resoluções relevantes da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA)" com os "ataques deliberados" à infraestrutura civil e instalação nucleares no Irã.
Em linhas gerais, o Brics decidiu repetir pontos de um texto sobre os ataques contra o Irã publicado no final de junho, desviando de apelos de Teerã pela responsabilização direta de Washington e Tel Aviv.
O objetivo do tom mais equilibrado foi evitar que o Brics fosse retratado como um bloco anti-Ocidente e anti-Donald Trump. As resistências ao tom agressivo defendido pelos representantes iranianos vieram de países como Índia, que tem intensa cooperação de inteligência com Tel Aviv, e de Emirados Árabes Unidos e Etiópia. O Brasil também atuou para moderar o resultado final do documento.
"Reiteramos nosso apoio às iniciativas diplomáticas destinadas a enfrentar os desafios regionais. Conclamamos o Conselho de Segurança das Nações Unidas a se ocupar desta questão", diz a declaração em outro trecho.
As dificuldades encontradas nas negociações nos últimos dias evidenciaram os desafios representados pela ampliação do número de membros do Brics, em 2023.
Se, por um lado, o bloco ganhou peso e ambição para se tornar um novo polo de poder global, por outro, enfrenta obstáculos maiores para alcançar consensos. Dentro do próprio Itamaraty, há a avaliação de que a ampliação do Brics trouxe complexidades, nomeadamente pelo grande número de novos integrantes do Oriente Médio, região onde há inúmeras particularidades e crises.
O Irã, que nem sequer reconhece o direito de Israel de existir, opunha-se a aceitar na declaração conjunta menções à solução de criação de dois Estados --um israelense e outro palestino-- como fórmula para superar o conflito no Oriente Médio. Para Teerã, a inclusão dessa referência significaria um reconhecimento implícito ao Estado de Israel, algo que o regime dos aiatolás rejeita desde a revolução islâmica de 1979.
Na linguagem acordada no documento final, o bloco mantém a tradição de apoiar a "adesão plena do Estado da Palestina às Nações Unidas no contexto do compromisso inabalável com a solução de dois Estados."
De acordo com negociadores, a delegação iraniana terminou isolada na sua posição. A solução de dois Estados é endossada por todos os demais membros do Brics, inclusive pelas nações árabes recém-incorporadas, como Egito e Emirados Árabes Unidos. Trata-se, nas palavras de um negociador, de uma manifestação abraçada em peso pelo Sul Global (grupo de países emergentes) e não havia maneira de recuar apenas para contemplar o desejo iraniano.
O documento final inclui sete menções a Israel ou "israelense" e também condena ações do país contra o Líbano e a Síria.