O agravamento dos transtornos mentais durante a pandemia da Covid-19

Ao Farol da Bahia, especialistas falam sobre suicídio, depressão e ansiedade

[O agravamento dos transtornos mentais durante a pandemia da Covid-19]

FOTO: Agência Brasil

Além de infecções e mortes, a pandemia da Covid-19, doença causada pelo novo coronavírus, vem causando transformações comportamentais e transtornos psicológicos na maioria dos brasileiros. A avalanche de notícias ruins, o isolamento social, necessário para conter o avanço da pandemia, e as atividades necessárias sendo executadas, em sua maioria, na modalidade remota, fizeram com que as pessoas fossem silenciosamente se afundando em uma tristeza constante. Essa realidade é evidenciada pelo aumento de problemas psiquiátricos ou neurológicos, como a depressão e  ansiedade, que em casos mais agudos ocasionam no suicídio. 

De acordo com especialistas, a prática do suicídio pode ser acasionada por vários fatores, dentre eles um excessivo grau de sofrimento. Antes de decidir exterminar a própria vida, é comum, ainda de acordo com especialistas, que essa pessoa apresente sinais de que não está conseguindo lidar com o sofrimento que  pode ser verdadeiro ou proveniente de algum transtorno afetivo, como em quadros de depressão e ansiedade. Em entrevista ao Farol da Bahia, a Dra. Miriam Gorender, diretora secretária adjunta da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), disse que durante a pandemia houve uma aumento expressivo de“ risco de suicídio, tentativas e suicídios completos”. Segundo ela, pensar no suicídio não é o mesmo que pensar na morte. Devido a complexidade do assunto em questão, ela explicou ainda como se manifesta o pensamento suicida.

“Pensar em suicído ou pensar na morte não é a mesma coisa que a ideação suicida. A ideação suicida, em geral, se apresenta como um pensamento intrusivo. É um tipo de pensamento que aparece para a pessoa como alguma coisa que muitas vezes ela não quer ter, mas que a atinge apesar dela sempre tentar afastar. Algumas pessoas falam de fato que querem morrer e que já decidiram, mas geralmente isso começa com pensamentos como, por exemplo, ‘era melhor eu não estar aqui’, ‘eu sou um fardo para todo mundo’ e ‘eu não aguento mais isso’. A partir daí são pensamentos e sentimentos que vão crescendo até que chega em um ponto que a pessoa chega no ato mesmo, no suicídio”, disse.

"Pensar na morte absolutamente todo mundo pensa uma hora ou outra como, por exemplo, você está em um lugar com bastante altura e pensa: ‘e se eu caísse daqui?’. Mas é uma coisa que passa brevemente na cabeça e não é levada a sério. A ideação suicida é uma coisa bem mais consistente e mais frequente. A ideação suicida é uma intenção ou um desejo de escapar do sofrimento muito grande”, completou.

Ele alertou ainda para a importância de prestar atenção no comportamento das outras pessoas e saber identificar quando não está se sentindo bem ou com algum problema que não está conseguindo lidar. Questionada sobre como ajudar amigos ou familiares que estejam enfrentando problemas psicológicos, como a ansiedade, ela respondeu: “A primeira coisa a fazer se a gente suspeita que a pessoa pode ter uma doença mental é levar ao médico especialista. Somente o médico psiquiatra pode diagnosticar se a pessoa tem ou não uma doença mental e pode dizer qual é o tratamento mais adequado. Então, se a pessoa tem uma doença, o tratamento vai ser médico. Acompanhamento psicológico, terapia e mudança no estilo de vida. Há uma série de coisas que nós podemos”, disse.

“Se o que a pessoa tem é um conflito emocional e não uma doença mental, a psicoterapia é o tratamento de primeira escolha. O ideal é que essa  pessoa seja avaliada por um médico especialista para que se descubra realmente onde é que está o problema”, completou.

Depressão e ansiedade

Em entrevista ao Farol da Bahia, a psicóloga Dra. Laís Ventura disse que a pandemia da Covid-19 ocasionou um aumento dos casos de depressão, mas principalmente de ansiedade. Ele disse ainda que há uma grande diferença entre os dois transtornos. “A depressão é uma alteração nítida no afeto, na cognição… As pessoas percebem o humor deprimido na maior parte do dia e em quase todos os dias e, além disso, há uma acentuada diminuição do interesse ou prazer em quase todas as áreas. Pode ser identificada na depressão uma perda ou ganho significativo de peso, insônia ou hipersonia quase todos os dias. Agitação ou retardo psicomotor, fadiga ou perda de energia também quase todos os dias”, disse.

“Sentimento de culpa excessiva ou inapropriada, capacidade diminuída para pensar ou se concentrar, pensamentos recorrentes de mortes e ideação suicida recorrente”, completou. Segundo ela, para ser considerado de fato um quadro de depressão uma pessoa precisa ter pelo menos cinco ou mais desses aspectos e, além disso, esses sintomas precisam estar presentes pelo menos no período de duas semanas.  “Essa diagnóstico precisa ser dado com muita propriedade e cuidado”, disse.

Já sobre a ansiedade, ela disse que “abre um leque de transtornos”. “O que ambas têm em comum é a característica do medo e de uma ansiedade excessiva. Os transtornos de ansiedade podem ser identificados através de um exame bem detalhado dos tipos de situações que são temidas e evitadas. Descobrir o que gera medo e ansiedade nessa pessoa… qual é o conteúdo dos pensamentos ou crenças associadas. Por exemplo, existem vários tipos  de transtorno de ansiedade: mutismo seletivo, fobia específica, transtorno ansioso social, pânico, entre muitos outros transtornos causados pela ansiedade”, completou.     

Saúde mental

A psicanalista Elizabeth da Rocha Miranda falou, em entrevista ao Farol da Bahia, sobre a importância de cuidar da saúde mental durante a pandemia e, além disso, falou sobre os muitos sentimentos e pensamentos que surgem nesse período. 

“O ser humano é gregário nasceu para viver com os semelhantes em bandos . Nossa alegria vem do convívio, precisamos do reconhecimento do outro, da crítica do outro, do afeto do outro, enfim precisamos do outro. A pandemia nos isolou e com isso tirou nossas referências, nossos afetos, nossos projetos que sempre precisam do outro porque nada se faz sozinho. Ademais, vivemos em suspenso porque pouco se sabe sobre o vírus e isso causa angústia”, disse. 

Como enfrentar um inimigo invisível e desconhecido. Não temos um líder que nos ampare ainda que só com palavras . Não temos um líder preocupado com nossas vidas e com a imunização do povo . Estamos à deriva e isso é ameaçador. Por tudo isso, cuidar da saúde mental em plena guerra biológica é fundamental para nossa sobrevivência. Precisamos falar dessa angústia para um profissional para esvaziá-la um pouco, para torná-la suportável”, concluiu. 


 


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