Vara da Lava Jato valida acordo para dividir com Mônaco R$ 160 mi confiscados de alvo da operação
A proposta do acordo, que tramita sob sigilo, foi apresentada à Justiça pelo Ministério Público Federal no Paraná, e tem o objetivo de destravar a liberação dos recursos.

Foto: José Cruz/Agência Brasil
JOSÉ MARQUES E ANA POMPEU
A 13ª Vara Federal de Curitiba, onde tramitaram os principais casos da Operação Lava Jato, validou um acordo para que o governo de Mônaco fique com metade dos R$ 162 milhões confiscados do ex-diretor de Serviços da Petrobras Renato Duque.
A proposta do acordo, que tramita sob sigilo, foi apresentada à Justiça pelo Ministério Público Federal no Paraná, e tem o objetivo de destravar a liberação dos recursos.
Esses valores estão em contas offshore no principado que pertenciam a Duque. Decisões judiciais anteriores determinavam que o dinheiro fosse encaminhado à Petrobras, como principal vítima dos desvios em contratos.
Pedido do Ministério Público destinado à Justiça Federal do Paraná e obtido pela Folha de S.Paulo solicitava urgência na apreciação e deliberação da minuta de um acordo com autoridades monegascas para que parte dos valores fosse transferida ao Brasil e outra parte ficasse com o governo de Mônaco.
A destinação desses recursos já é alvo de contestação, tanto na primeira instância quanto no TRF-4, mas, até o momento, os recursos foram negados, e a medida pode ter cumprimento imediato.
Em momentos anteriores, juízes da vara da Lava Jato em Curitiba haviam decidido que o montante confiscado de Duque deveria ser destinado à Petrobras, vítima das irregularidades.
Tanto o então juiz Sergio Moro (hoje senador pelo União Brasil-PR) como o magistrado Luiz Antônio Bonat (que foi promovido e hoje integra o Tribunal Regional Federal da 4ª Região) tomaram decisões nesse sentido.
No caso deste acordo, nem a Petrobras nem a defesa de Duque nem a União foram chamados para se manifestar antes da homologação da proposta do MPF.
Outros acordos da operação já foram alvo de polêmica no Supremo. Em 2019, o ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Alexandre de Moraes decidiu contra a competência da 13ª Vara Federal do Paraná para decidir sobre a destinação de multas acertadas pela Petrobras nos Estados Unidos.
A vara havia homologado um acordo para a gestão privada desses recursos. O ministro escreveu na sua decisão que o órgão não tinha competência para fechar um compromisso sobre a destinação do dinheiro. Afirmou ainda faltar também aos procuradores da Lava Jato no Paraná as atribuições para essa gestão.
No mesmo ano, o próprio Moraes validou um acordo para direcionar à Amazônia e a investimentos em educação os recursos oriundos dessas multas.
No caso dos valores confiscados de Duque, a PGR (Procuradoria-Geral da República) afirmou que o MPF no Paraná deveria remeter a proposta de Mônaco à Justiça, para que fosse feita a análise.
O Judiciário decidiu aceitar a proposta do Ministério Público Federal, que permite, segundo o órgão, "a posterior elaboração do acordo final a ser providenciada pela PGR".
A Procuradoria da República no Paraná entendeu que cabe à própria 13ª Vara Federal validar o acordo de Mônaco. "A competência para a repatriação e destinação dos ativos confiscados, nos termos do acordo internacional, cabe ao Juízo que proferiu a decisão de confisco passível de execução no exterior", disse o órgão em seu pedido.
"Dessa forma, é a 13ª Vara Federal que detém a competência para apreciar e deliberar sobre as medidas assecuratórias que instrumentalizam o bloqueio dos ativos no exterior."
O MPF afirma ainda que a proposta de partilha, se homologada, seria "assinada pela Procuradoria-Geral da República e as autoridades congêneres de Mônaco, assim como serão adotados os demais atos rogados pela Secretaria de Cooperação Internacional do MPF, como a nova instauração de colaboração jurídica internacional".
Procurado pela reportagem, o Ministério Público Federal no Paraná disse que o processo está em sigilo e, por isso, não irá se manifestar. A defesa de Duque afirmou que irá responder somente nos autos.
QUEM É RENATO DUQUE
O ex-diretor da Petrobrás foi um dos principais alvos da Lava Jato e também um dos que ficou mais tempo detido.
Sua primeira passagem pela prisão foi entre novembro e dezembro de 2014. Depois, ele ficou outro período, de março de 2015 até março de 2020. Usou tornozeleira até abril de 2023.
No ano passado, uma juíza federal do Paraná determinou que ele retornasse à prisão porque ainda deveria cumprir pena privativa de liberdade de 39 anos, 2 meses e 20 dias, em regime fechado.
Essa pena se referia a quatro condenações por crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro com trânsito em julgado, ou seja, sem possibilidade de recurso. Neste ano, ele migrou para o regime semiaberto.
Ao longo do período de prisão, ele se propôs a colaborar com a Justiça, confessou ter cometido crimes e aceitou abrir mão do dinheiro em contas no exterior. Também fez acusações contra o hoje presidente Lula (PT).
Em novembro, o ministro Gilmar Mendes, do STF, pediu para levar ao plenário presencial da Segunda Turma o julgamento de um recurso do ex-diretor da Petrobras contra todos os atos da força-tarefa da Lava Jato e de Moro. Ainda não há data para julgamento do caso.

