Adriano Azevedo

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Na nossa série “Inesquecíveis”, escreverei algumas linhas sobre determinadas personalidades do Ilê Axé Opô Afonjá, com as quais tive a honra e o privilégio de conviver e, por conseguinte, conhecer. Começo com Ogun: Orixá desbravador, aquele que abre os caminhos – o Asiwajú. Dou início a esta série com um grande ícone do Candomblé da Bahia, homem que deixou muita saudade para nós, do Opô Afonjá e para aqueles que o conheceram. 

Nascido na Ilha de Itaparica em 18 de junho de 1934, Moacyr Barreto Nobre era carinhosamente chamado de Môa ou Moacyr de Ogun. Filho de Edite Avelina de Jesus e de Almerindo Barreto Nobre, ele  se iniciou para o Orixá Ogun em 06 de junho de 1961, aos 27 anos, pelas mãos de Maria Bibiana do Espírito Santo, a afamada Mãe Senhora de Oxun. Moacyr aprendeu o Candomblé na vivência. Foi um aluno exemplar e, por ser de poucas palavras – o que é ouro no Candomblé, 

Moacyr se tornou um exímio sacerdote, visto que possuía a magia dos Orixás em sua essência. No silêncio e sem alarde, construiu tal conhecimento – bem diferente – infelizmente – do que ora vigora: com todo mundo e qualquer um se dizendo conhecedor e publicizando tudo o que é visto nas Casas de Candomblé.

O título deste artigo foi copiado de um documentário feito em sua homenagem, que foi dirigido por Iyá Cléo Martins de Iansã e pelo cineasta Lázaro Farias – este, in memoriam. O adjetivo “Matreiro” traduz quem foi Moacyr de Ogun: perspicaz; inteligente; astuto; malandro e manhoso. Ah! Ele também tinha a fama de brigão [risos]. Lembro-me, com muita graça e saudade, de um episódio que aconteceu na festa de Oxossi. Explico melhor: para entrarmos nos quartos dos Orixás se faz necessário tirarmos os calçados. Com um monte de chinelos na porta de Oxossi, alguém saiu e, por engano, calçou o chinelo de Moacyr. Após uma procura incessante com todos os que ainda estavam presentes, Moacyr – sem sucesso – subiu pra sua casa descalço. Da casa de Oxossi até a sua casa – que fica ao lado da casa de Ossain - Môa resmungava [risos]. A noite chegou e, na hora da festa, era perceptível o movimento dele dançando na roda e olhando os pés de todo mundo. E, como conhecia seu temperamento, perguntei: “Achou o chinelo, meu tio?”; com um olhar furioso, me mirou dos pés à cabeça, deu as costas e resmungou, dando muxoxo. Depois só foi resenha [risos].

Gente de todo canto da Bahia, e até do Brasil, vinham na festa de Ogun só para ver o Ogun de Moacyr que, de forma excepcional, bailava por todo o barracão ao som dos atabaques. Em 25 de novembro de 1979, Moacyr funda o Ilê Axé Alakayê, situado em Paripe, no bairro de Tubarão. Ele era muito amigo de Mãe Stella, a quem tratava como irmã. Como a vida é cheia de surpresas, infelizmente, numa segunda-feira apôs os três dias da festa de Oxossi, em 18 de junho de 2001, de forma súbita e causando choque em todo mundo, Môa nos deixa e retorna para o encontro com seus Ancestrais. Parecia inacreditável, pois na noite anterior ele estava bem e feliz. Nunca tinha visto tia Stella chorar; nem quando tia Corintha, sua irmã mais velha, faleceu. Cochichando bem baixinho e olhando para o pé de Irokô, tia Stella disse: “Por que você se foi, meu irmão? Por que me deixaste só?!”. Ali eu percebi o quanto ela o amava.

Moacyr deixou um legado enorme, e hoje é lembrado com muito amor e carinho, pois sua passagem por aqui deixou frutos muito bons.


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