• Home/
  • Notícias/
  • Política/
  • 1 em cada 3 projetos sobre saúde no Congresso contraria ou duplica normas já existentes no SUS

1 em cada 3 projetos sobre saúde no Congresso contraria ou duplica normas já existentes no SUS

Um exemplo é o PL 2264/2024, sobre a disponibilização de liraglutida e semaglutida na Rename

Por FolhaPress
Às

1 em cada 3 projetos sobre saúde no Congresso contraria ou duplica normas já existentes no SUS

Foto: Arquivo / Agência Brasil

A atividade legislativa do Congresso Nacional em 2024 contrariou ou duplicou normas já existentes do SUS (Sistema Único de Saúde) em 37% dos projetos na área, segundo levantamento do Ieps (Instituto de Estudos para Políticas da Saúde) em parceria com a Umane.

A análise examinou mais de 2.568 matérias legislativas. Dessas, 1.314 tinham relação direta com a saúde e foram analisadas em profundidade, sendo 683 projetos e 631 requerimentos.

Ao todo, daqueles que estabelecem alguma relação com políticas públicas, 26% foram classificados como conflitantes com as políticas de saúde existentes, e 11%, como repetitivos. Os projetos analisados foram os que tramitaram em comissões relacionadas à saúde: Comissão de Assuntos Sociais, no Senado, e comissões de Saúde e de Previdência, Assistência Social, Infância, Adolescência e Família, na Câmara.

Segundo os pesquisadores, muitos desses projetos impõem obrigações diretas ao SUS sem considerar os processos técnicos de avaliação, especialmente em temas como tecnologias em saúde, regulação sanitária e saúde mental.

Um exemplo é o PL 2264/2024, sobre a disponibilização de liraglutida e semaglutida na Rename (Relação Nacional de Medicamentos Essenciais), desconsiderando o processo técnico e participativo conduzido pela Conitec (Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde), diz Rebeca Freitas, diretora de Relações Institucionais do Ieps.

Outras propostas mexem com diretrizes do SUS, como o PNI (Programa Nacional de Imunizações), caso do PDL 22/2024, que propõe revogar a decisão técnica do Ministério da Saúde de incluir a vacina contra a Covid-19 no calendário de vacinação infantil para crianças de 6 meses a menores de 5 anos.

Ainda, o PL 1822/2024 —que garante aos pais ou responsáveis o direito de determinar a internação imediata de jovens e adolescentes com dependência química, em situação de vulnerabilidade social ou ameaçados por traficantes de drogas contrapõe diretrizes da Reforma Psiquiátrica. Segundo o relatório, dentre projetos sobre saúde mental, 18% contradizem diretrizes já consolidadas.

O Ieps aponta que, se aprovadas, essas propostas podem criar insegurança jurídica e até inviabilizar práticas reconhecidas como eficazes, com impactos diretos na gestão e no atendimento do SUS.

Também são comuns propostas que replicam normas já previstas em portarias, resoluções ou protocolos técnicos. Conforme os pesquisadores, embora transformá-las em lei possa reforçar seu caráter de política de Estado, isso também pode engessar a política, uma vez que qualquer atualização futura exigirá nova aprovação pelo Congresso, dificultando a atualização e adaptação das normas a mudanças de contexto ou novas evidências.

É o caso do PL 45/2021, que cria o Cadastro Nacional de Vacinação contra a Covid-19. A proposição duplica sistemas já existentes, sem apresentar lacunas a serem supridas por uma nova legislação, afirmam.

A avaliação dos pesquisadores é que as propostas são usadas como instrumento de visibilidade e engajamento, na lógica das redes sociais, sem priorizar o assunto de forma adequada.

"A lógica da rede social já atingiu o parlamento, e a produção legislativa é um pedacinho dos componentes dessa equação, porque é a partir dela que os parlamentares demonstram esse posicionamento para a sua base. Então, os incentivos políticos acabam muitas vezes induzindo essa legislação que é mais repetitiva, que tem um forte apelo popular e que, muitas vezes, sobrepõe o que já está constituído como política ou até mesmo sobrepõe projetos de lei que já foram protocolados sobre o mesmo tema", diz Freitas.

Cerca de 14% dos projetos analisados têm como objetivo principal a realização de campanhas de conscientização ou a criação de datas para o reconhecimento simbólico de causas específicas na saúde. É o caso do PL 3414/2021, que institui o "fevereiro cinza" para ansiedade.

"Elas têm seu valor simbólico e político. Mas é importante lembrar que não substituem políticas estruturantes que melhorem efetivamente o atendimento e o funcionamento do SUS. Campanhas simbólicas representam 14% das propostas, enquanto menos de 10% dos projetos focam em aprimorar a estrutura do SUS."

Segundo a cientista social, a ideia do estudo, no entanto, não é propor uma crítica ao Congresso Nacional, mas apontar padrões e fomentar o debate de temas que tenham maior impacto, como o de emergência na saúde.

"Na época da pandemia de Covid-19, o Congresso, na medida do possível, conseguiu agilizar algumas medidas que foram essenciais. O que a gente preconiza nesse estudo, na nossa atuação, é que a saúde não seja prioridade só na hora da urgência, mas que ela seja uma prioridade como política de Estado."

Outros projetos funcionam como complementação de políticas já existentes, casos que podem ser positivos para aprimorar o que já existe.

A questão é quando projetos fazem ajustes pontuais, que não alteram, de fato, questões decisivas sobre essas políticas.
"Quando a gente se debruçou sobre esses resultados, a nossa conclusão foi que quando os poderes não conversam, o SUS sofre."

A ideia é que o documento seja um instrumento para conscientizar parlamentares a subsidiar, por exemplo, formações para os gabinetes parlamentares, e o fortalecimento de comissões permanentes e de mérito, que segundo Freitas, foram enfraquecidas nos últimos anos por uma priorização do debate no plenário

"São as comissões que analisam o mérito das propostas, que tem um papel muito importante para evitar que as propostas que não estão alinhadas com o fortalecimento das políticas de saúde, do SUS, continuem tramitando. São nessas comissões que a tramitação dessas propostas pode ser abreviada."

Comentários

Os comentários são de responsabilidade exclusiva de seus autores e não representam a opinião deste site. Se achar algo que viole os termos de uso, denuncie:redacao@fbcomunicacao.com.br
*Os comentários podem levar até 1 minutos para serem exibidos

Faça seu comentário