Desemprego na mínima histórica não reduz informalidade nem aumenta produtividade
Com melhor estrutura em empresas regularizadas, um trabalhador formal é quatro vezes mais produtivo do que um informal, segundo o FGV/IBRE

Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
FERNANDO CANZIAN
Com o nível de desemprego no menor patamar da série histórica, em 5,6% no trimestre encerrado em setembro, o Brasil não tem sido capaz de reduzir a taxa de informalidade, que se mantém perto de 40% da força de trabalho ocupada há uma década.
A produtividade média dos trabalhadores também está estagnada. Em um contexto de economia aquecida e descrito por alguns setores como de "apagão de mão de obra", sem aumento da produção por hora trabalhada, empresários têm de pagar mais para atrair pessoal, repassando o custo aos preços, o que é inflacionário.
Com melhor estrutura em empresas regularizadas, um trabalhador formal é quatro vezes mais produtivo do que um informal, segundo o FGV/IBRE (Instituto Brasileiro de Economia). Apesar de o Brasil ter criado 4,6 milhões de vagas com carteira desde 2023, como ainda há um número expressivo de informais no mercado (40,8 milhões, segundo a PnadC do IBGE), eles tendem a puxar a produtividade para baixo.
O quadro de informalidade poderia ser pior não fosse a explosão no total de MEIs (microempreendedores individuais) e de PJs (pessoas jurídicas) nos anos recentes. Minimamente formalizados, os chamados conta própria com CNPJ saltaram de 3,3% para quase 7% da força de trabalho em pouco mais de dez anos.
Muitos dos novos trabalhadores que entraram no mercado adotaram esse modelo de contratação (MEI e PJ) para terem mais flexibilidade. Há ainda os que optaram por passar da CLT para esses regimes com o mesmo objetivo, o que acabou mantendo a taxa de formalização estável.
Pesquisa Datafolha em junho apontou que 59% dos brasileiros prefeririam trabalhar por conta própria, ante 39% que se sentiriam melhor contratados contratados e 31% que consideram mais importante ganhar mais do que estar registrado.
Em termos salariais, os conta própria com CNPJ têm rendimento médio superior (R$ 4.947) aos formais com carteira no setor privado (exceto domésticos), que recebem R$ 3.200.
Segundo o Ministério do Trabalho e Emprego, outros podem ter sido obrigados por empresas a adotar os modelos para reduzir encargos da carteira assinada, que chegam a 70% sobre o salário. Levantamento da pasta sustenta que, entre 2022 e julho deste ano, 5,5 milhões de CPFs de trabalhadores migraram diretamente da carteira assinada para regimes de conta própria com CNPJ.
"O fato é que contratar empregados CLT no Brasil ainda custa muito caro porque o governo precisa arrecadar para financiar seus gastos. Isso faz com que empresas e trabalhadores adotem o 'meio do caminho, via MEIs e PJs, numa espécie de semi-informalidade", afirma Sérgio Vale, da MB Associados.
Na consultoria em que atua como economista-chefe, Vale diz que clientes de setores como agronegócio e varejo relatam dificuldades crescentes para encontrar mão de obra. Na construção civil, a maioria dos canteiros opera com pessoal 10% aquém do necessário, diz Yorki Estefan, presidente do SindusCon-SP, que reúne construtoras no estado.
"Há um fluxo migratório menor do Nordeste, que historicamente trazia mão de obra, e muitos trabalhadores, sobretudo os mais jovens, evitam a CLT em troca de flexibilidade", diz Estefan.
Segundo ele, contratar bolivianos, nigerianos e mais mulheres (para funções menos pesadas) tem sido uma das saídas, além de aumentar os salários acima da inflação.
Mesmo assim, algumas das profissões que mais geraram vagas na última década tiveram rendimentos relativos diminuídos na comparação entre 2012 e 2024, segundo trabalho do economista Nelson Marconi, da FGV-Eaesp. O fato indica certa precarização no mercado de trabalho.
O estudo considera o rendimento médio das profissões e dos setores analisados igual a 1. Assim, é possível observar quais áreas pagam acima ou abaixo da média, e como as remunerações variaram de 2012 a 2024, segundo dados do IBGE.
Já a produtividade por hora trabalhada no Brasil não cresce, o que dificulta às empresas produzir mais sem pressões de custos causadas pelo aumento das contratações e dos salários.
Segundo Silvia Matos, do Observatório da Produtividade Regis Bonelli, a entrega por hora trabalhada cresceu só 0,3% ao ano nos últimos cinco anos. Mas a renda per capita aumentou 1,7% ao ano, sustentada pelo crescimento da taxa de ocupação (+1,1% ao ano). Ou seja, houve alta expressiva no número de pessoas empregadas em relação ao aumento da população economicamente ativa.
Para Matos, essa combinação de dados revela que o crescimento da taxa de ocupação (que trouxe o desemprego a 5,6%) representa um fator "cíclico" para o aumento da renda per capita, não "estrutural".
"Em resumo, para manter um ritmo de alta da renda per capita a taxas mais elevadas e sem gerar desequilíbrios é crucial que haja aumento da produtividade. Sem isso, não teremos garantia de que o crescimento será sustentável", diz Matos.
Uma das principais causas da baixa produtividade é o fato de o Brasil ser um país fechado para o mundo, com participação irrisória de 1% no comércio internacional e pouco exposto à competição externa, que obrigaria empresas a serem mais eficientes.
Para José Pastore, da FEA-USP e especialista em trabalho, a atual robustez do mercado tem sido mantida pelo aumento de gastos do governo, que considera insustentável.
"Há um 'apagão de mão de obra', com custos crescentes para as empresas. O aquecimento é provocado por uma política populista de elevação da despesa pública. É bem provável que isso se sustente até as eleições de 2026, mas é uma conjuntura artificial que vai capotar mais à frente", diz.

