Despreparo e falta de políticas impedem acesso de transsexuais aos serviços de saúde durante a pandemia
Pesquisa aponta que metade dos serviços voltados para essa população foram suspensos

Foto: Reprodução/Ministério da Saúde
Desde dezembro de 2011 está em vigor a Política Nacional de Saúde Integral de LGBT instituída pela Portaria nº 2.836, que na teoria garante à população o atendimento de saúde integral proposto pelo SUS (Sistema Único de Saúde). Porém, isso não é o que se vê na prática.
Segundo Bruna Benevides, secretaria de articulação política da ANTRA (Associação Nacional de Travestis e Transexuais), apenas cinco hospitais em todo o Brasil que realizam procedimentos de redesignação de gênero atualmente.
"Hoje os cuidados com saúde de pessoas trans se limita à combate à HIV e processos de transição de modo que parece que pessoas trans ou vive com o vírus ou quer mudanças nos caracteres sexuais secundários", afirma Bruna, referindo-se às questões genitais por exemplo, e completa: "não se olha para saúde mental, saúde reprodutiva e outros pontos essenciais da vida de qualquer pessoa".
Despreparo profissional
A ginecologista obstetra Ana Thais Vargas, que se dedica ao atendimento da população trans desde 2016 aponta ainda o despreparo dos profissionais da área para o atendimento. "Não existe um reconhecimento da transexualidade, não se respeita nome social e identidade de gênero das pessoas e a grande maioria ignora solenemente o tratamento de pessoas trans".
A médica conta ainda que muitos profissionais se recusam a atender transsexuais por não se sentirem capazes de lidar com a situação, e aponta ainda que a falta de formação é um outro fator que influência no momento do atendimento.
"Existem particularidades no atendimento, por exemplo de homens trans, como o uso recorrente de binder e packers, os efeitos dos hormônios, como se dá a fertilidade dessas pessoas e chegam até a ignorar a indicação métodos anticoncepcionais para eles", relata.
Pandemia
Uma pesquisa interna da rede de afiliadas da ANTRA estimou que 50% dos serviços de atendimento de população trans foram paralisados durante a pandemia. "Ouvi relatos muito desesperados de mulheres trans que me diziam que preferiam morrer de Coronavírus do que viver em um corpo que não às representavam", relata Bruna.
A urgência faz inclusive com que muitas pessoas recorram ao uso de hormônios por conta própria como Diana. "Comecei a transição em outubro e logo comecei com os hormônios porque não queria ficar em uma fila de espera, mas agora já fui na UBS, fiz as consultas e os exames e estou só aguardando para ir buscar os hormônios”.
Ela revela, no entanto, que a maioria das pessoas resolvem fazer o uso dos medicamentos por conta própria e dispensa um acompanhamento profissional. “Moro com uma amiga que transicionou há dois anos e só agora tá começando a ir atrás, a gente tem medo da demora, de ser atendida de mal jeito, tem toda uma questão", relata.