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Funcionários negros não são Martin Luther King, afirma fundadora do Movimento Black Money

Para Nina Silva, a boa relação com os investimentos é uma forma de inserir a comunidade negra nas regras do jogo de hoje

Por Da Redação
Ás

Funcionários negros não são Martin Luther King, afirma fundadora do Movimento Black Money

Foto: Divulgação

Há vinte anos atrás, a jovem negra de origem periférica já era expert na área de TI (tecnologia da informação). Trabalhou na Alemanha e foi questionada por um colega (homem branco) sobre o fato de não ter se esforçado em arranjar um marido gringo, no lugar do emprego. “Sempre foi problemático aos homens entenderem como uma mulher preta entregava [projetos] melhor do que a maioria deles”, diz. “Sofri muita misoginia e racismo”.

Ao voltar para o Brasil, anos depois, Nina se viu atravessada por uma inquietação comum entre as mulheres negras que estão no mercado de trabalho: a sensação de ser sempre a única na equipe. Daí surgiu o ponto de partida para um desafio: "como eu insiro pessoas negras no mercado de trabalho e garanto que elas não vão passar pelos espaços e tratamentos hostis por que passei?" Ela encontrou a resposta em um mecanismo, já testado por judeus, asiáticos e afro-americanos, que visa fazer circular toda a riqueza produzida entre quem pertence à comunidade.

Em entrevista ao Infomoney, Nina conta que conheceu seu sócio Alan Soares, "que já falava do conceito e estava focado em trazer acessibilidade para nossos pares no mercado financeiro, o Movimento Black Money. Foi um telefonema de horas e, uma semana depois, o Movimento Black Money tinha site e a gente estava dando entrada no CNPJ". Nascia, então, em 2017, o Movimento Black Money [dinheiro preto, em tradução livre], que se desdobrou em um banco digital e em ações educacionais para que a população negra, a maioria dos brasileiros, tenha melhores condições de vida a partir da autonomia financeira.

"Queremos gerar nossa própria cadeia produtiva, estimulando o espírito inovador para a criação de diferenciais competitivos no mercado. Algumas das nossas principais iniciativas são o “Mercado Black Money”, um marketplace do qual participam mais de 1.800 lojistas pretos, e o projeto “Impactando Vidas Pretas”, que capta doações financeiras com instituições privadas, editais e pessoas físicas para ajudar famílias lideradas por mães solos e afroempreendedores que foram desassistidos durante a pandemia, com transferência de renda e fomento a micro e pequenos negócios", explica Nina. 

O movimento conecta consumidores e empresários que possuem compromissos sólidos com a causa negra. Nina diz que o afroempreendedorismo no Brasil é, em grande parte, feminino, solitário e fortemente ligado ao comércio, à comunicação e à indústria de cuidados.

Um dos desafios do Movimento Black Money, aponta pela executiva, é a questão financeira. Ela cita o estudo “Afroempreendedorismo Brasil”, realizado pelo Movimento, que aponta uma baixa renda na grande maioria das famílias negras brasileiras, e muitas vezes as ideias de empreender vem de uma dor, e as dores desses empreendedores estão ligadas à questão racial. 

Além disso, Nina destaca outro desafio: a falta de crédito financeiro. "Afroempreendedores têm crédito três vezes mais negado em instituições financeiras tradicionais e acabam abrindo um negócio por necessidade pela precarização das relações de trabalho e desemprego. O afroempreendedorismo parte de um não lugar social e precisa da comunidade negra para desenvolvê-lo como estratégia coletiva", afirma Silva.

Nina Silva também fala na entrevista ao Infomoney sobre a inclusão de pessoas negras no mercado de trabalho. Ela diz que o principal erro das empresas na inclusão de negros em seu quadro de funcionários é essas poucas pessoas precisam "demandar um problema histórico da companhia". "Estas pessoas pretas não estão ali contratadas para realizar esse trabalho, mas precisam ser Martin Luther King, Malcolm X ou Angela Davis —trabalhar dia e noite para essa inclusão que vai beneficiar principalmente a própria empresa", ressalta a executiva. 

Ela ainda salienta que "as empresas pecam e muito em achar que a causa racial, é do negro, a de gênero, é da mulher, e não de quem detém os privilégios há tantos anos e que nem sabe no dia de hoje se levantar da cadeirinha do privilégio e colocar esse amigo ou amiga para sentar ali e começar a lidar de maneira estratégica".

O "novembrismo", termo cunhado para concentrar a agenda racial em novembro, atrapalha inciativas como o Movimento Black Money, pois fazendo isso, as empresas transmitem a ideia de que qualquer iniciativa feita no mês de novembro, já é tudo o que as grandes empresas e determinados grupos poderiam fazer no combate às desigualdades raciais, aponta Nina Silva. Segundo ela, as empresas "se esquecem de propagar, seguir e consumir esses profissionais ao longo do ano, a gente vê que muito do que temos em ativismo, entre aspas, é uma busca por like e tentativa de demonstrar propósito que não está enraizado em ações concretas". 

Para Nina Silva, é contraproducente demonizar os investimentos, pois “é a forma, no momento, que temos para inserir a comunidade nas regras do jogo”. "Eu costumo dizer que o Black Money não é sobre direita e nem esquerda. Não é sobre fazer com que façamos a decisão se capitalismo ou socialismo é melhor para pessoas pretas. A gente ainda não está nesse lugar de mudança estrutural nem enquanto sociedade como um todo, quiçá, enquanto grupo minorizado"

Nina chama a atenção para o fato de as relações institucionais estarem pautadas no capital, sendo esse o meio para inserir pessoas negras no mercado. "A gente precisa minimamente ter as nossas relações humanizadas. E se as nossas relações institucionais e sociais estão pautadas no capital, que a gente utilize dele em benefício dos nossos semelhantes, dos nossos iguais", complementou a executiva Nina Silva.

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