Mais de 400 casos de violência entre torcidas de futebol foram registrados no Brasil entre 2023 e 2024
Dados são de um levantamento do Observatório Social do Futebol, divulgados em um seminário do Ministério Público da Bahia

Foto: Reprodução/Redes Sociais
O Observatório Social do Futebol registrou cerca de 461 casos de violência entre torcidas de futebol em todo o Brasil, entre os anos de 2023 e 2024. As informações foram divulgadas no seminário "Violência não marca ponto no esporte: causas, consequências e soluções", sediado no Ministério Público da Bahia, nesta sexta-feira (5).

Foto: Farol da Bahia
Segundo o levantamento, 158 casos foram registrados no ano de 2023, enquanto em 2024 as ocorrências quase dobraram, sendo registrados 303 ocorrências. O professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e Co-fundador do Observatório Social do Futebol, Nicolás Cabrera, responsável pela apresentação, destaca que o aumento entre os registros dos casos não necessariamente indicam um maior índice de violência, mas sim a evolução dos métodos do observatório no levantamento dos dados.
Cabrera ainda revelou que entre os casos que resultaram em morte, no ano de 2023 foram calculados 18%, com 30 óbitos, enquanto no ano de 2024, 10% dos envolvidos não resistiram as agressões, com 32 mortos em números absolutos.
O levantamento apresentado pelo professor da UFRJ ainda revelou que do total de casos de violência entre torcidas, a maioria deles, cerca de 70%, aconteceram fora dos estádios. Entre esses, 37% ocorreram no entorno dos estádios em um raio de até 5 km, e 33% em distância superior a 5 km dos estádios.
Os números mostram que apenas 22% dos casos aconteceram dentro dos estádios. As sedes das torcidas foram palcos de apenas 2% das ocorrências.
Locais das ocorrências | Foto: Reprodução/Observatório Social do Futebol
Quando observado o percentual dos atores envolvidos nos casos de violência nos estádios. 47% dos casos são de responsabilidade dos torcedores de diferentes times; 25% torcedores e forças de segurança; 7% torcedores do mesmo time; 5% torcedores e jogadores; e 1 ponto percentual em: dirigentes e arbitragem, dirigentes e torcedores, entre jogadores, torcedores e arbitragem e torcedores e técnicos.
Atores envolvidos nas ocorrências | Foto: Reprodução/Observatório Social do Futebol
Recomendações
Durante a apresentação, Cabrera ainda detalhou pontos de recomendações para minimizar os casos de violência. São eles:
- estabelecer um órgão oficial ou fortalecer um já existente para monitorar e registrar, de forma contínua e padronizada, todas as ocorrências de violências ligadas ao futebol;
- desenvolver um protocolo nacional de coleta de dados sobre violências ligadas ao futebol a partir de diversas fontes confiáveis;
- reavaliar a política de torcida única já que em estados como São Paulo e Paraná não tem demonstrado eficácia na redução da violência. Sugere-se um estudo mais aprofundado sobre os impactos dessa medida, com a possibilidade de promover eventos com torcidas mistas, acompanhado de iniciativas de conscientização e campanhas de paz;
- criar um sistema de monitoramento contínuo das alianças e rivalidades entre torcidas organizadas ao nível nacional. O “Mapa das Alianças” poderia ser uma ferramenta para identificar e prevenir confrontos antes de eventos críticos, como clássicos estaduais e interestaduais;
- como 70% dos casos de violência ocorrem fora dos estádios, especialmente durante o trânsito de torcedores, seria importante fortalecer a segurança nas áreas próximas e trajetos frequentes, como rodovias, estações de trem e metrô, e praças. A coordenação entre forças de segurança pública e privada também deve ser melhorada;
- promover a punição individual dos envolvidos em atos violentos por meio do uso de CPF, em vez de penalizar a torcida organizada como um todo (CNPJ). Isso evitaria a punição coletiva e garantiria que os infratores sejam diretamente responsabilizados;
- devido ao aumento de mortes causadas por armas de fogo, é fundamental implementar um controle mais rigoroso sobre o acesso e a circulação de armas. Também seria benéfico lançar campanhas de conscientização dentro das torcidas organizadas para desestimular o uso de armas;
- treinar e supervisionar as forças de segurança, tanto públicas quanto privadas, para lidar adequadamente com multidões e utilizar de forma correta armamentos de menor potencial ofensivo. Os três óbitos de torcedores em 2023 envolvendo a segurança pública mostram a necessidade de maior supervisão e capacitação;
- regulamentação do uso do reconhecimento facial nos estádios brasileiros com o intuito de reduzir os erros e abusos com o uso da tecnologia, com padronização de ação policial em casos em que a tecnologia apresenta um caso positivo. Para não se repetir o que aconteceu com o torcedor do Confiança-SE em abril de 2023, há a necessidade dos clubes e instituições públicas produzirem relatórios acerca dos acessos com essa tecnologia apresentando, inclusive nos casos de falso positivo;
- atenção ao transporte público na saída dos clássicos, com a maior oferta para os torcedores. Podendo haver de estabelecimento saída em horários distintos, mesmo em jogos com torcida 50%-50%. Além da escolta de torcida (torcidas organizadas e outros movimentos torcedores) após o jogo. Muitos casos ocorrem no trajeto para os estádios e carecem de atenção;
- e maior diálogo entre autoridades e torcidas organizadas: fortalecer a comunicação entre o poder público, as torcidas organizadas e as suas associações, para construir políticas de segurança que contemplem as realidades das torcidas, promovendo uma cultura de paz e convivência pacífica nos estádios e fora deles.
Ações da Polícia Militar
Em entrevista ao Farol da Bahia, o Tenente-Coronel, Flávio Farias, citou a atuação dos órgãos de Segurança Pública e da Polícia Militar no planejamento das ações para minimizar os casos de violência entre torcidas.
"Todo evento é realizado com o diálogo entre as torcidas organizadas, em união aos órgãos de Segurança Pública e Ministério Público e a partir disso são pensadas as ações para os próximos jogo", disse o Tenente-Coronel.
Tenente-Coronel Flávio Farias destacou diálogo dos órgãos de Segurança Pública com o Ministério Público | Foto: Farol da Bahia
Lei Geral do Esporte
Durante a apresentação do seminário, o Desembargador do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia (TJBA), Lidivaldo Reaiche, destacou a criação da Lei Geral do Esporte (LGE), como forma de reforçar a legislação esportiva brasileira em um único texto.
O desembargador ainda destacou a importância da atuação da Lei para diminuição do caso de violência que vão além das agressões físicas, mas também integram violências em questões raciais e de gênero.


