Mas afinal, o que é o Sul Global?
Confira artigo completo do diplomata e mestre em Relações Internacionais, Ronaldo Vieira

Foto: Arquivo Pessoal
O termo Sul Global deixou de ser jargão acadêmico para se tornar uma força viva na diplomacia e na economia mundial. Mais do que um conceito, é uma escolha consciente de autonomia frente às potências tradicionais. O Brasil, como país em desenvolvimento, tem diante de si uma oportunidade concreta de redefinir seu papel no mundo, rompendo com velhas dependências e consolidando novas alianças estratégicas.
Não se trata apenas de “participar de um sistema”. O verdadeiro ponto é como se escolhe jogar dentro dele. Tanto o Sul Global quanto o Norte Global coexistem no mesmo tabuleiro, mas com mentalidades e códigos éticos distintos. O Norte ainda insiste em ditar as regras; o Sul, por sua vez, quer reescrever o jogo, com base em valores de reciprocidade, diversidade e pragmatismo. A diferença entre ambos é menos geográfica e mais comportamental.
O Sul Global nasce de uma aspiração dentro da ONU – mas também de uma reação. É uma resposta ao modelo ocidental de desenvolvimento que, por décadas, ditou o que os demais deveriam ser e fazer. Sob a popularização de pensadores como Boaventura de Sousa Santos e J. Sombra Saraiva, e com a atuação de Celso Amorim, o Brasil encontrou nessa agenda um espaço para exercer influência real, especialmente por meio de coalizões como o BRICS. É política externa, mas é também estratégia de sobrevivência em um mundo que exige voz própria.
E os resultados já são visíveis. Diversificar mercados não é apenas uma decisão econômica — é uma medida de necessidade. Reduzir a dependência dos Estados Unidos e da União Europeia significa assumir o controle das próprias vulnerabilidades, algo que as “lições do tarifaço” já haviam evidenciado. O acesso a novas fontes de financiamento, como o Novo Banco de Desenvolvimento, é outro pilar dessa reconfiguração, embora ainda subaproveitado.
A diferença agora é que o Brasil não atua mais na periferia de um sistema imposto — ele pode ser protagonista de um sistema em construção. Isso exige maturidade política e clareza ética. O discurso da reciprocidade e da “escuta ativa” não pode ser apenas retórico. Ouvir o outro, cooperar sem impor modelos e respeitar os contextos locais são atitudes que definem a legitimidade de quem pretende liderar.
Por isso, o desafio brasileiro é menos sobre “qual sistema” escolher e mais sobre como agir dentro de cada um. Liderar o Sul Global requer consistência, credibilidade e propósito — não apenas boas intenções. Se o Norte-Sul ainda é útil, que se use com inteligência. Se o Sul Global é o futuro, que se construa com coerência. O que o mundo observa agora é se o Brasil saberá equilibrar pragmatismo e princípios no momento em que ambos são mais urgentes do que nunca.
Vanessa Africani, especialista em comunicação e marketing com experiência profissional em promoção de negócios. Atua na promoção com ênfase no continente africano e na promoção de relações bilaterais e comerciais com diversos países do Mercosul, Américas e África


