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Morre Lô Borges, compositor que inovou na MPB e músico do grupo Clube da Esquina

Músico morreu na noite deste domingo (2), em Belo Horizonte, mas falecimento só foi divulgado nesta segunda-feira (3)

Por FolhaPress
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Morre Lô Borges, compositor que inovou na MPB e músico do grupo Clube da Esquina

Foto: Lucas Seixas/Folhapress

Em agosto, Lô Borges exibiu uma produtividade incomum para um cantor e compositor de 73 anos. Ele lançou o álbum "Céu de Giz", com músicas dele e letras de Zeca Baleiro, simplesmente o sétimo disco de canções inéditas gravado por ele nos últimos sete anos.

Diante de tanta disposição, seus fãs foram pegos de surpresa com a internação do cantor mineiro, no dia 17 de outubro, devido a uma infecção medicamentosa, segundo os boletins do hospital causada por remédios tomados em casa. No dia 25, ele passou por uma traqueostomia e já respirava com ajuda de aparelhos.

O músico morreu na noite deste domingo (2), em Belo Horizonte. A informação foi confirmada pelo hospital Unimed de Contorno, onde ele estava internado. Borges morreu de falência múltipla dos órgãos.

Salomão Borges Filho nasceu em 10 de janeiro de 1952, em Belo Horizonte, e tinha dez irmãos numa família com vínculos musicais fortes. Ainda adolescente, nos anos 1960, passava a maior parte do tempo no bairro de Santa Tereza com os amigos, tocando violão em rodas que privilegiavam o repertório dos Beatles, o grupo predileto de todos. Essa relação evoluiu para a formação do que se chamou Clube da Esquina, um movimento musical que integrava influências de música mineira, rock, samba e até uma pitada de psicodelia.

No time, além de Lô estavam seu irmão Márcio Borges, que ao lado de Fernando Brant e Ronaldo Bastos era um dos letristas da turma, os cantores e compositores Beto Guedes e Flávio Venturini, o tecladista Toninho Horta e o baixista Novelli. À frente do grupo, Milton Nascimento, que já gravava discos individuais e tinha um sucesso nacional, a canção "Travessia".

Em 1972, Lô Borges e esse pessoal colaboraram com Milton Nascimento no álbum seminal "Clube da Esquina", que se tornaria um marco incontornável da música popular brasileira. Muito jovem, com 20 anos, Lô impressionou bastante o pessoal da gravadora e, segundo gostava de relatar, chegou desesperado para contar a Milton que tinha assinado um contrato para um disco solo.

"Eles adoraram suas músicas. Você deveria estar contente", disse Milton. "Mas eu não tenho nenhuma música, usei todas no nosso disco! E eles querem gravar esse mês. Eu quero ir para a praia!", berrou um angustiado Lô. Mas ele passou o mês compondo de madrugada e gravando durante o dia, para lançar seu álbum de estreia, "Lô Borges", o famoso "disco do tênis", por causa da foto na capa, um dos melhores álbuns de estreia da MPB.

A imagem do tênis largado no chão simbolizava o desejo jovem de partir, viajar, ter experiências na estrada. No álbum já estavam composições que se tornaram clássicos, como "Paisagem da Janela" e "O Trem Azul", que viriam a ganhar versões por outros artistas e se consolidar no repertório de qualquer músico de barzinho que se preze.

Nos anos seguintes, mesmo diante de um mercado difícil e das pressões da gravadora diante de seu comportamento um tanto "hippie", Lô Borges continuou a sua carreira. A cada lançamento, buscava seu equilíbrio entre o lado autor-compositor com o de intérprete, gravando vários álbuns solo e colaborativos.

Após um período de pouca visibilidade na cena musical, lançou em 1979 "A Via Láctea", seu segundo álbum solo a ter destaque. A crítica foi unânime ao apontar que ali ele mostrava uma maturidade maior, tanto em composição quanto em performance como cantor.

Ao longo dos anos 1980, 1990 e 2000, Lô manteve uma produção relativamente discreta, em termos de número de lançamentos. Ele gravou apenas cinco discos num período de mais de duas décadas, entre 1980 e 2003.

Mas sua influência só crescia: suas músicas eram interpretadas por outros artistas, suas harmonias e melodias serviam de referência para gerações posteriores. Por exemplo, no início dos anos 2000, a canção "Dois Rios", sucesso com o Skank, juntou uma trinca de gerações na composição. Foi escrita por Lô, Nando Reis e Samuel Rosa.

Neste século, seguiu lançando álbuns, colaborando e revisitando seu catálogo, mostrando que a criatividade não se esgotou com o tempo. Musicalmente, ele é reconhecido por fundir estilos: a base da música popular brasileira, com samba, bossa nova e música mineira de raiz, dialoga tranquilamente com o rock e o jazz.

Sua abordagem harmônica e melódica é, muitas vezes, bem sofisticada. Nas letras, quando se arriscava, as canções transitam entre o pessoal e o coletivo, o autobiográfico e o simbólico. Há uma predileção por temas universais que talvez ajude a explicar por que tanta gente regravou suas canções.

Sua participação no Clube da Esquina, a originalidade de seu primeiro álbum solo e a continuidade de sua produção fizeram dele uma figura central para se entender a música mineira, a MPB e as relações entre música popular e experimentação no Brasil. Há tempos, ele foi e segue sendo referência para músicos mais jovens, que buscam explorar suas raízes musicais com olhar contemporâneo.

Lô Borges começou como talento precoce em Belo Horizonte, lançou um álbum solo emblemático ainda jovem, passou por fases de menor visibilidade, mas manteve consistência e influência ao longo da carreira. Depois, já na casa dos 60 anos, buscou energia e inspiração para discos relevantes e lançados em profusão.

Seu disparo final de álbuns de material inédito tem "Rio da Lua" (2019), "Dínamo" (2020), "Muito Além do Fim" (2021), "Chama Viva" (2022), "Não Me Espere na Estação" (2023), "Tobogã" (2024) e o recente "Céu de Giz", com Zeca Baleiro. Na lista pode ser incluído também o registro de show "50 Anos de Música: Ao Vivo na Sala Minas Gerais", lançado em 2023.

Ainda em 2023, o cineasta Rodrigo de Oliveira dirigiu o documentário "Lô Borges: Toda Essa Água", que não trouxe muita informação pessoal de uma artista sempre muito reservado em sua vida privada. Para os fãs de Lô Borges, basta sua música singular, entre a tradição e a ousadia.

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