• Home/
  • Notícias/
  • Bahia/
  • Salvador, Feira de Santana e Vitória da Conquista alfabetizaram menos da metade das crianças em 2024, aponta MEC; atraso compromete ensino médio

Salvador, Feira de Santana e Vitória da Conquista alfabetizaram menos da metade das crianças em 2024, aponta MEC; atraso compromete ensino médio

Alfabetização é responsabilidade dos municípios. Especialista alerta para precarização do trabalho do professor.

Por Da Redação
Ás

Atualizado
Salvador, Feira de Santana e Vitória da Conquista alfabetizaram menos da metade das crianças em 2024, aponta MEC; atraso compromete ensino médio

Foto: SMED/Salvador

Menos da metade das crianças da rede pública até o 2º ano do ensino fundamental foram alfabetizadas nas três maiores cidades da Bahia, em 2024. Os dados, divulgados pelo Indicador Criança Alfabetizada do Ministério da Educação (MEC), mostram que Salvador, Feira de Santana e Vitória da Conquista registraram índices abaixo de 50%.

Salvador alfabetizou apenas 36,75% das crianças, ficando na 182ª posição entre os 417 municípios baianos; já entre as capitais brasileiras, a cidade tem o pior desempenho. Feira de Santana teve 33,19% de crianças alfabetizadas e ocupa a 230ª colocação no ranking estadual. Vitória da Conquista, com 42,75%, aparece na 107ª posição.

Conquista e Salvador chegaram a registrar quedas frente a 2023, quando tiveram índices de 47,9% e 39,2%, respectivamente. Já Feira teve aumento de 1,19% (foram 32% de crianças alfabetizadas na idade certa no ano anterior).

No Brasil, a alfabetização é de responsabilidade dos municípios, que devem garantir o domínio da leitura e escrita até o final do 2º ano do ensino fundamental. Do 5º ao 9º ano do ensino fundamental, passa a ser misto, com escolas municipais e estaduais. Já o ensino médio fica a cargo dos estados. 

O Farol da Bahia buscou as gestões das três cidades, mas não obteve retorno sobre o assunto. Já a Secretaria de Educação da Bahia informou que tem atuado de forma conjunta e permanente com os municípios, através de regime de colaboração, com o objetivo de promover avanços no ensino público municipal. [Leia a nota na íntegra no final da matéria] 

No cenário estadual, a Bahia registrou o menor índice de alfabetização infantil do país, ficando abaixo do nível 2, que corresponde à média nacional. Em um número semelhante ao de Salvador, o estado teve 36,80% das crianças alfabetizadas e não atingiu a meta de 43%, estabelecida pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) em 2023 para orientar avanços na educação. 

A situação reflete um problema histórico. A Bahia tem o maior número de analfabetos do Brasil há pelo menos 32 anos. Segundo dados do Censo Demográfico de 2022, divulgados no ano passado, 1.420.947 pessoas de 15 anos ou mais não sabiam ler nem escrever.

Em entrevista ao Farol da Bahia, a secretária de educação do estado, Rowenna Brito, destacou a queda nos percentuais de educação de municípios como Salvador e Vitória da Conquista como responsáveis pelo baixo índice da Bahia.

“O que inquieta um pouco a gente é a quantidade dos municípios que tiveram uma diminuição do índice de alfabetização, como os maiores municípios. Quando esses grandes municípios diminuem o número de crianças alfabetizadas, a média da Bahia naturalmente cai”, pontuou.

Desafios

A equipe técnica do MEC informou que atua na Bahia para identificar gargalos e auxiliar gestores na formulação de políticas públicas. O Farol da Bahia conversou com o professor, pedagogo, avaliador do MEC e mestre em Educação de Jovens e Adultos, Basilon Carvalho, que destacou a necessidade de investimentos estruturais para a educação avançar.

“O professor não é o Superman. Se não tem apoio, ele estagna, e a precarização docente é absurda. A gente não pode negar que um professor chega para ministrar suas aulas e encontra, muitas vezes, alunos sem se alimentar, turmas grandes e dificuldades de aprendizagem baseadas na ausência de incentivos”, afirmou.

Os educadores em Salvador têm travado um longo impasse com a prefeitura, que reflete essa precariedade. Em greve desde o dia 6 de maio, os professores pedem pelo pagamento integral do piso nacional do magistério, fixado em R$ 4.867,77 e desafado em 58%, além de melhores condições de trabalho nas escolas. Até o momento, a prefeitura não acatou os pedidos e a greve continua.

O pedagogo explica que quem mais sofre as consequências dessas paralisações são as crianças, que perdem tempo de aprendizado e ficam fora das salas de aula. Para ele, a responsabilidade é da gestão municipal, que falha em garantir os direitos básicos de professores e estudantes. 

“Essas crianças estão sendo prejudicadas por uma falta de responsabilidade da gestão municipal. Se você tem compromisso com a educação e existe um piso, então pague, porque ele precisa ser pago. Uma vez que esse professor está em precarização docente, isso vai reverberar na educação. Na greve, a família muitas vezes está com a criança em casa e precisa ir trabalhar, e essa criança está perdendo o processo de ser alfabetizada. Há uma negação social do direito da educação”, analisou.

Outro problema em Salvador, que atinge em cheio a rotina educacional das crianças, é a insegurança. A média de aulas suspensas nas escolas municipais em 2024 foi de uma a cada cinco dias devido a violência. Basilon afirma que as pausas ao longo do ano letivo fazem parte do problema. 

“Muitas periferias não têm aula porque o tráfico determina. Se uma parceria entre município, Estado e União fornece segurança de fato para que essas crianças estejam na escola e os pais fiquem despreocupados com seus filhos não percam a vida indo, voltando, e estando na escola, com certeza [o índice] vai avançar”.

O especialista defende como pilares do processo de educação das crianças o melhor tratamento aos professores, além de união entre a escola e a família, com atenção especial para uso excessivo de telas.

“A responsabilidade pela alfabetização é de toda a comunidade escolar e a família. A família não pode relegar na escola toda a educação doméstica e alfabetização na mão desse professor. Nos últimos anos conseguir manter uma criança atenta à aula sem as redes sociais tem sido surreal. Os pais também precisam impor limites nesse uso”, concluiu.

Alunos chegam ao EM sem alfabetização completa

Na rede estadual, os reflexos da defasagem na alfabetização são evidentes. Professores convivem com estudantes que enfrentam dificuldades graves em leitura, escrita e operações matemáticas, herdadas da etapa anterior, a cargo da rede municipal.

Uma professora do ensino médio da rede estadual de ensino, que preferiu não se identificar, descreveu ao Farol da Bahia que os alunos costumam demonstrar problemas em solicitações básicas.

“Os estudantes que chegam ao ensino médio possuem problemas sérios na execução dos cálculos básicos, em subtração, divisão e multiplicação. Além disso, há problemas graves de leitura e interpretação que combinam com a má qualidade da escrita”, disse.

Os atrasos no aprendizado obrigam os professores a lidarem com um impasse diário em sala de aula. Sem a base adequada, muitos estudantes não conseguem acompanhar os conteúdos do ensino médio. Segundo a docente, lecionar certos temas se tornou inviável. 

“Os professores, então, precisam trabalhar sob as seguintes questões: avançar o conteúdo do ensino médio ou trabalhar assuntos do fundamental. No meu caso, infelizmente trabalhar assuntos de filosofia mais complexos como Kant e Aristóteles é um grande desafio. Preciso trabalhar os conceitos de modo muito básico e cobrar o básico na prova”.

Como solução, a professora defende maior integração entre as redes municipal e estadual e a realização de um diagnóstico prévio dos estudantes que ingressam no ensino médio. 

“É preciso que toda a rede da educação básica saiba quais são os conteúdos trabalhados e como os alunos estão em relação a eles. Uma ideia dada por uma colega seria uma prova antes da matrícula, para que pudéssemos entender o estado dos alunos que chegam para nós. Não como uma forma de segregar, mas uma maneira de pensarmos, antes do início do ano letivo, como trabalhar esses problemas nos primeiros meses de aula”.

O que diz a Secretaria de Educação da Bahia

“A Secretaria da Educação do Estado tem atuado de forma conjunta e permanente com os municípios, através de regime de colaboração, com o objetivo de promover avanços no ensino público municipal. Entre as iniciativas estão a construção e entrega de prédios escolares, aquisição de mobiliários, transporte, alfabetização, infraestrutura, além da formação de equipes técnicas e professores nas Universidades Públicas Estaduais. Por meio de convênios com as prefeituras, o Governo do Estado também já promove repasses de recursos destinados à educação oferecida no âmbito municipal. As ações buscam impulsionar a qualidade da educação básica e evitar a evasão escolar, auxiliando na permanência do estudante até a sua chegada ao ensino superior.

Bahia Alfabetizada - O Governo da Bahia conseguiu aprovar, em março de 2025, o Projeto de Lei 25668/2025, que institui a criação do Programa Bahia Alfabetizada.  No âmbito do programa, através da Secretaria da Educação e além das iniciativas já existentes, o Estado vai prestar cooperação técnica, pedagógica e financeira aos municípios baianos para que garantam o acesso, permanência e continuidade dos estudos na educação básica para as crianças, jovens, adultos e idosos. O programa prevê investimentos contínuos no ensino oferecido pelas prefeituras, por meio da concessão de bolsas e fortalecimento de iniciativas de colaboração entre a gestão escolar e a gestão do município.”

Comentários

Os comentários são de responsabilidade exclusiva de seus autores e não representam a opinião deste site. Se achar algo que viole os termos de uso, denuncie:redacao@fbcomunicacao.com.br
*Os comentários podem levar até 1 minutos para serem exibidos

Faça seu comentário