Três em cada 10 brasileiros não compreendem o que leem
Educador baiano recomenda o hábito da leitura e políticas públicas para enfrentar o problema

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É grande a quantidade de pessoas no Brasil que mesmo sabendo ler e escrever algo simples, não tem as competências necessárias para satisfazer as demandas do seu dia a dia e viabilizar o seu desenvolvimento pessoal e profissional, pois não compreendem o que leem e são incapazes de emitir opiniões ou interpretar textos. São os chamados analfabetos funcionais.
Segundo o indicador que mede esta deficiência no país, o Inaf, elaborado por meio de questionários e aplicação de testes práticos pelos especialistas da ONG Ação Educativa e o Instituto Paulo Montenegro, no ano de 2018, houve um aumento de 2% do analfabetismo funcional no país em comparação a 2015.
Ainda segundo esse mesmo índice, no ano passado, cerca de 73% dos brasileiros estavam plenamente alfabetizados, enquanto que aproximadamente 29% foram considerados analfabetos funcionais. Quando é analisado o nível escolar, os números mostram que dentro do Ensino Superior, por exemplo, há 4% de analfabetos funcionais. Já no Ensino Médio, apenas 14% são proficientes no grupo de alfabetizados e nos anos finais do Ensino Fundamental esse número é de apenas 6%.
O levantamento mostra também uma forte relação entre a escolaridade e os hábitos de leitura. As pessoas que tem uma alfabetização básica e os que tem uma alfabetização consolidada leem numa proporção semelhante livros de literatura por vontade própria (30% e 37%, respectivamente). Já em relação à leitura de livros técnicos e de formação profissional, a diferença fica em 16% (25% e 41%, respectivamente).
Leitura e Políticas Públicas
A prática da leitura aliada à adoção de políticas públicas é a solução apontada pelo professor de Filosofia, Washington Oliveira, para combater o problema do analfabetismo funcional. "A leitura é o que permite o sujeito interagir com o mundo e precisa ser compreendida em um contexto mais amplo. Ler textos impressos, mecanismos audiovisuais, o mundo panorâmico que a gente tem, as emoções e as relações", afirma o educador baiano.
Segundo Oliveira, a leitura tradicional é a porta de entrada para uma leitura mais aprofundada. "Ler é ver, interpretar, compreender e interagir. As políticas públicas servem para desenvolver essa capacidade da leitura. Os 73% que não estão enquadrados como analfabetos funcionais também precisam ler e exercitar o que chamamos de tri leitura, ler um fenômeno três vezes para compreender o que está por detrás dele", conclui.
O Farol da Bahia procurou a Secretaria Estadual da Educação para saber se há alguma política pública voltada especificamente para esta problemática, no entanto, a pasta disse haver políticas apenas para combater o analfabetismo tradicional como programas de alfabetização de jovens e adultos que não sabem ler e escrever. Segundo a SEC, desde 2007, o programa Todos pela Alfabetização (Topa) já alfabetizou cerca de 1,5 milhão de pessoas, incluindo povos e comunidades tradicionais.
A SEC destacou que os gestores escolares desenvolvem nas escolas públicas projetos de incentivo à leitura como, por exemplo, o Clube de Leitura Sociedade Literária Desigual em Feira de Santana, no centro norte do estado, criado em 2016, com o objetivo de promover o conhecimento sobre as culturas regional, nacional e internacional e, por consequência, criar consciência e reflexão sobre temas de interesse social. A iniciativa ainda tem a parceria do Núcleo de Leitura da Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS).
A Secretaria da Educação de Salvador também foi procurada pelo Farol da Bahia, mas até o fechamento da reportagem não respondeu se desenvolve alguma política para combater o analfabetismo funcional.
Mensuração IBGE
Devido a algumas discussões teóricas sobre o que de fato seria um analfabeto funcional, o IBGE deixou de usar essa nomenclatura nas suas pesquisas. Houve um entendimento de que a variável anos de estudo sozinha não era exatamente suficiente para medir esse indicador. Então, o Instituto mensura apenas o porcentual de pessoas sem instrução e com menos de 5 anos de estudo (ou seja, menos que o primeiro ciclo do fundamental completo).
Na Bahia, em 2018, cerca de 2,662 milhões de adultos de 25 anos ou mais de idade não tinha instrução ou tinham estudado menos de 5 anos completos, o que representa 28,7% das pessoas nessa faixa etária no estado. No ano passado, havia no Brasil, 23,4 milhões de pessoas de 25 anos ou mais nesta condição, o que representa 17,5% da população adulta.
De acordo com a última Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNADC), divulgada em junho pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a taxa de analfabetismo na Bahia se manteve entre 2017 e 2018 em 12,7%. Nove em cada dez pessoas que não sabem ler nem escrever no estado (87,6%) têm 40 anos ou mais.
No país, entre 2016 e 2018, a taxa de analfabetismo caiu de 7,2% para 6,8% na faixa de 15 anos ou mais, no entanto, apesar da queda, o Brasil pode não cumprir a meta de erradicação no ano de 2024.


