Na terça-feira, dia 13 último, mais uma polêmica invadiu as redes sociais, desta vez foi a tentativa de inauguração de um santuário com uma estátua de Lúcifer na cidade de Gravataí (RS) – localizada na região metropolitana de Porto Alegre (RS). Uma juíza, provocada pelo município, barrou a colocação de uma estátua de cinco metros do anjo decaído que quis competir com Deus, reza a lenda. O local do espaço foi mantido sob sigilo pela Nova Ordem de Lúcifer na Terra e as autoridades alegaram que tal “ocultação” poderia acarretar “situações catastróficas”. A imagem foi encomendada pela ordem e havia a expectativa de que 100 pessoas comparecessem ao evento de abertura do local. O endereço do espaço, que fica na zona rural de Gravataí, foi mantido sob sigilo pelos representantes do culto após receberem ameaças de morte e vandalismo no santuário. A maioria se colocou como cristã, “na proteção dos valores de suas crenças”. Não entendo o cristianismo desse povo.
Hoje falar de laicidade do País é apenas discurso retórico, porque na prática o que estamos percebendo é o avanço do desrespeito ao contraditório, naquilo que não seja o que determinados grupos têm como verdade. O Estado laico não se trata, em cristalina verdade, de uma visão restrita ao direito de se professar a fé que se quer e abraça. Quando falamos da laicidade do Estado também são garantias fundamentais aos direitos humanos, em sociedade pluralista, em proteção à dignidade da pessoa humana, nas suas escolhas e buscas lícitas. Falamos em cidadania, em isonomia de direitos e deveres. O tema, portanto, vai além de questões religiosas, mas guarda, em análise última, entendimento de liberdade e proteção. Incrível, mas um deputado federal baiano pediu moção de aplauso para a juíza, dizendo que não se tratava de intolerância religiosa. Sei. Vejo com gravidade um município brasileiro, justiça e parlamentares impedindo a livre manifestação de uma crença, por mais que possa nos parecer esquisito e ou exótica, em nome de se evitar catástrofe. Acredito que em alusão as agressões e vandalismo que o local, discreto, privado, poderia sofrer. Ora, parece-me o poste urinando no cachorro, pois caberia ao Poder Público garantir a manifestação dos cultuadores da seita ou religião. Afinal de contas, também, houve ameaças de morte, de cometimento de crime aos profitentes da Nova Ordem de Lúcifer na Terra. A base da alegação foi, outrossim, a falta de alvará para funcionamento. Os membros dessa ordem poderiam provocar também o Ministério Público a checar todas as igrejas, templos, centros que não tenham o tal alvará. Claro, que há necessidade de ter e deve se buscar o funcionamento sob o manto dos ordenamentos jurídicos, afinal é regramento legal. Não se pode, todavia, combater uma ilegalidade com ações inconstitucionais, apenas para um lado. Tudo se torna lamentável e desrespeitoso ao sentido de liberdade de crença e até de não fé, de ateísmo. Tudo é povo brasileiro que precisa ser respeitado em seus atos legais.