O golpe militar de 1964, no Brasil, foi levado a cabo por seus chefes com a finalidade de restaurar a ordem ameaçada e proteger a democracia. A ruptura violenta da ordem constitucional foi apresentada à Nação como uma revolução democrática, com previsão de eleições diretas e retorno ao regime da lei e da normalidade. Ledo engano!
Ao assistir, incrédulo e chocado, o discurso do Presidente do Brasil no Chile, Lula da Silva, numa reunião de alguns presidentes latino americanos e o primeiro ministro espanhol, reunião convocada para tecer considerações sobre a democracia e seu futuro na América do Sul, o que vi foi o réquiem da Democracia.
Lula reproduziu a cena ensaiada em 64. Ao desfiar as virtudes da democracia, promovia a sua morte. Sem pudor, o “guia genial dos povos”, afirmou com todas as letras e ares de grande sabedoria, que fazia corar um Norberto Bobbio redivivo, que “a democracia liberal não foi capaz de responder aos anseios e às necessidades contemporâneas”.
Quem conferiu a Lula o mandato de coveiro da democracia liberal?
O apedeuta mor da república não satisfeito com o fim do regime constitucional, das leis e das liberdades, depositou a pá de cal na sepultura da democracia. Disse ele com toda a empáfia: “cumprir o ritual eleitoral a cada quatro ou cinco anos não é suficiente”. O que seria suficiente em lugar das eleições, que representam o coração dos regimes democráticos?
Mais ainda, o déspota não se conteve, e do auge de sua reputação como cientista político disparou mais esta pérola do pensamento, provavelmente sobre o panorama brasileiro: “o sistema político e os partidos caíram em descrédito. Por essa razão, conversamos sobre o fortalecimento das instituições democráticas e do multilateralismo, em face dos ataques sucessivos que vem sofrendo”. De te fabula narratur!
Realmente, a demolição da vida política e institucional foi uma meticulosa empreitada da aliança do governo Lula com a alta corte judiciária do país. Todas as instituições e garantias contidas na Constituição sofreram danos irreparáveis e os poderes da república perderam sua independência e autonomia.
As etapas preliminares para a implantação de uma ditadura civil já foram concluídas. O terreno está sedimentado. As instituições típicas da ditadura civil, foram enunciadas no discurso do Presidente Lula: o fim de democracia constitucional, a ineficiência dos processos eleitorais e a miséria do sistema político e da estrutura partidária.
O que, afinal, será necessário para a implantação definitiva de uma ditadura civil?
Lula ainda se dá a pachorra de nos ameaçar com as medidas coercitivas sobre a liberdade de expressão e as plataformas digitais. Para ele elas visam “devolver ao Estado a capacidade de proteger seus cidadãos”. Pergunta obrigatória: e quem protegerá o cidadão do leviatã estatal, sem os meios da democracia liberal em seus dias derradeiros?
Depositar nossas expectativas nas eleições de 2026 é um erro palmar. José Saramago, em um dos seus livros, é certeiro: “a cegueira também é isto, viver num mundo onde se tenha acabado a esperança”.
O que podemos esperar, sem lei ou esperança, senão interromper esta marcha rumo ao desconhecido, um desconhecido mais claro e inegável que este impresso nas palavras do guia genial dos povos.