Cultura

Entrevista Negra Li

A cantora Negra Li fala os leitores do farol da Bahia sobre sua luta pelo empoderamento feminino

Por Da Redação
Ás

Entrevista Negra Li

Foto: Divulgação/ Pam Martins

Com 16 anos a cantora Negra Li entrou para o mundo do Rap. Rodeada de homens, ela foi uma das pioneiras entre as mulheres no meio do rap nacional. Em 2006 estreou a série Antônia na Globo junto com Leilah Moreno, Quelynah e Cindy Mendes, às quatro negras eram protagonistas que falavam sobre preconceitos e já abordavam temas feministas.  Após 12 anos sem gravar, Negra Li voltou com o novo trabalho intitulado Raizes. Como atuante nas causas femininas, a cantora fala ao Farol da Bahia sobre a importância de voltar às suas raizes do rap, defender seus ideais e lutar pela liberdade da mulher e contra o preconceito. 

Farol da Bahia: Qual a importação do posicionamento das mulheres no período atual, onde estamos vivendo com os altos índices de feminicídio e em um momento que se fala tanto do empoderamento feminino? Qual a importância de ressaltar a imagem da mulher que vai muito além de uma mera reprodutora?

Negra Li: Eu sempre tenho em mim que toda luta e manifestações são para lembrar e refletir sobre tal assunto. E acho que hoje o posicionamento feminino serve para isso: discutir e analisar tudo que já conquistamos e que precisamos ainda conquistar. A mulher é importante para a sociedade, indispensável e apesar de tantas coisas que já conquistamos com lutas, em alguns quesitos ainda parece que estamos andando para trás. Temos que ser unidas e ouvidas em prol dessa causa. Buscar nosso lugar de respeito e acabar com a violência contra a mulher. Para isso, acredito que a educação é a base de tudo. As crianças precisam aprender a respeitar o próximo desde novinhos.

FDB: Você tem uma filha e um filho (Sofia e Noah). Nessa busca pela representatividade da mulher negra, o que você tem passado par sua filha que vai crescer nesse mundo ainda cheio de preconceitos?

Negra Li: Eu tento deixar ela ciente dos direitos dela. Sempre discutimos em casa vários aspectos da sociedade, assuntos que ocorrem no nosso dia a dia. Sempre quando surge alguma reportagem falando sobre, abrimos um diálogo sobre o assunto. Conversamos com a Sofia sobre com quem ela pode conversar, quem pode toca-la, de como ela deve agir contra bullying na escola e certos preconceitos. Porque infelizmente ou felizmente preciso prepará-la.  Às vezes falo: “olha filha é cruel te dizer isto, mas tal tipo de coisa pode acontecer”. Tenho que abrir os olhos dela, não posso criar algo utópico e depois ela se deparar com algo que não está preparada para enfrentar. Então eu converso sobre tudo com ela, conto um pouco da história das mulheres, da consciência negra. Falo inclusive que ela também já é uma inspiração para outras meninas da sua idade.

FDB: Você começou aos 16 anos no mundo do rap. Como foi para você ser uma mulher negra tão nova no meio dos rappers?

Negra Li: Então, era mais fácil ser uma mulher negra no rap do que ser mulher. Era mais comum. Hoje em dia não, hoje a maioria são brancos, pelo menos os que estão em evidência ou tem mais números na internet. Mas pra mim, a situação mais diferente era por ser uma das únicas mulheres nesse movimento. Mas até eu mudei na época. Eu passava todos os dias rodeada de homens, então eu meio que passei a imitar eles, novinha, mal tinha ido para a balada, então foi meio que um jeito para me proteger, era um meio machista, não podia dar risada alto, não podia usar saia no palco, não podia cumprimentar com beijo, mas, na época, eles não faziam por mal, eles achavam que estavam fazendo para me proteger, porque às vezes o machismo está tão enraizado que ultrapassa o razoável. Mas isso foi até bom porque me tornei muito observadora. Com o tempo, eu fui entendendo meu espaço de mulher negra no rap, principalmente depois do seriado Antônia, transmitido pela Globo. Não era comum ver 4 protagonistas negras na televisão e isso mexeu com muita gente e com as crianças. Foi uma febre na rua, todos comentavam. Era um seriado bem representativo e feminista já. Até lutamos na época para conseguir um horário melhor (passava sexta-feira, 21h), mas não conseguimos, ainda sim foi sucesso e fiquei muito feliz.  Mas aí chegou um momento que cansei desse papel e fiquei curiosa para conhecer e transitar por outros ritmos e vertentes. Lembro que fui fazer um show de rap que começava às 5h da manhã, e eu ficava muito doente, era cansativo demais, fiquei cansada desse negócio de cantar só na noite e tiroteio e ser revistada e tal. Em 2006, 10 anos depois de viver no rap eu comecei a buscar reconhecimento como cantora, não só como rapper. Queria cantar em teatros, festivais com cantores de outros meios também. Recebi conselhos do Chorão (Charlie Brown Jr.) sobre a importância de andar por outros mercados e vertentes e que eu podia mais. Então me joguei. Lancei o CD Negra Li. 

FDB: Fala sobre suas inspirações e parcerias desse seu último trabalho intitulado Raizes.

Negra Li: Raizes representa tudo que eu sou e de como comecei. Fala sobre raiz do cabelo, raiz musical, raiz da minha etnia e representatividade. Acho que durante um tempo conseguimos andar pra frente, ter um certo reconhecimento e tal, mas agora parece que estamos dando passos para trás. Então esse CD veio para realçar isso, lembrar de onde cada um veio, de quem você é, de ir atrás de representar uma minoria, e tem tudo a ver com o que estamos vivendo em relação ao governo também. Então já que é pra voltar, resolvi voltar lá nas minhas raizes, todo aquele sentimento que eu tinha e o que pelo eu lutava, preconceito, racismo e abandono da sociedade. Tem participação do Gaab, Cintia Luz, Rael e Seu Jorge, Karol com K também estaria presente mas ela acabou precisando viajar e não deu tempo, faltou uma mulher negra no meu trabalho sem ela. 

FDB: Quais os planos para o futuro? Pretende voltar a Bahia?

Negra Li: Estive aí para a gravação do DVD do Gaab, mas amo a Bahia, vocês me recebem tão bem, tão gostosa, valorada! Preciso voltar mais para esse lugar, quem sabe com um novo disco né? Quero voltar com tudo para esta Bahia que eu amo!

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