Óleo no Nordeste: desastre ambiental completa dois anos sem desfecho
Especialistas analisam impactos ambientais

Foto: Getty Images
O surgimento das manchas de óleo no Nordeste completa dois anos nesta segunda-feira (30), sem que haja uma previsão de desfecho. No dia 30 de agosto de 2019, praias dos municípios de Pitimbu e Conde, no litoral da Paraíba, foram atingidas pela primeira vez pelo óleo. Dali em diante, o óleo foi se alastrando, e somente até março de 2020 o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Renováveis (Ibama) contabilizou 1.009 localidades afetadas em 130 municípios. A informação é do portal UOL.
Com mais de 3.000 km de litoral atingido, o acidente com óleo é considerado o maior em extensão já visto. No último dia 2, o material reapareceu no litoral sul da Bahia. Manchas também surgiram este mês em Fernando de Noronha, mas ainda sem comprovação de que é a mesma substância. De acordo com o Diretor do Instituto de Biologia da Universidade Federal da Bahia (Ufba), Francisco Kelmo, serão necessários cerca de 10 anos para que haja uma recuperação completa das áreas atingidas. "Quando se tem um acidente como esse, existem dois tipos de efeitos: os agudos, registrados horas após a chegada do óleo; e os crônicos, que duram anos. A gente calculou em torno de 10 anos para ver uma recuperação completa", disse.
No geral, mais de 80% da biodiversidade de invertebrados foi perdida na área estudada. O branqueamento dos corais atingiu quase 90% da população. Houve redução de 85% de animais vivos por m² de praia. Este é um prejuízo muito significativo para a natureza, especialmente para os invertebrados sésseis, aquelas espécies que, diante do perigo, não têm como 'correr'. E como serve de alimentos para animais maiores, esse animais e consequentemente, para todo o ecossistema marinho afetado.
Após dois anos, pesquisas já apontam danos de longo prazo gerados pelo acidente ambiental de proporções inéditas no mundo e que até hoje não tem origem ou causa descobertas. Um inquérito sobre o caso continua aberto na Polícia Federal (PF).
O desastre continua. Recentemente, especialistas encontraram óleo nas praias, especialmente nas estruturas rígidas [rochas, corais e beachrocks]. “Esse material pode ser já bem endurecido devido à intempérie do ambiente, mas pode ser também ainda no seu estado similar de quando foi lançado há dois anos", explica Rivelino Cavalcanti, pesquisador e oceanógrafo do Instituto de Ciências do Mar da UFC (Universidade Federal do Ceará).
"O grande problema é que cada vez mais o material está se reduzindo e ficando em uma escalas menores a cada dia, e isso certamente dificulta a sua observação", completa. O pesquisador Emerson Soares, que participou do grupo que avaliou danos em Sergipe, alerta que um dos problemas para prever o fim dos problemas é não saber a origem, nem a quantidade de óleo despejado no mar.
"O risco persiste por não sabermos a quantidade que ainda resta no fundo do oceano ou que está enterrado nas praias sob a areia. Entretanto, boa parte das moléculas orgânicas ou com propriedades mais cancerígenas, já foram diluídas, evaporaram, foram recicladas pelas bactérias ou reagiram com outros compostos e perderam as propriedades mais agressivas quanto ao potencial de contaminação", aponta.
Pesquisadores apontam, entre os impactos, a redução de algumas famílias de peixes na região de Itamaracá. Outra perda constatada é na diversidade genética de uma espécie de cavalo-marinho no estuário de Maracaípe, em Ipojuca, em torno de 15%. Todas essas perdas foram constatadas em comparação com estudos anteriores nas mesmas regiões
Outro dano foi o impacto na fisiologia em todos os estágios da vida dos animais. "A gente percebeu, por exemplo, que aqueles animais que estavam expostos ao óleo, a produção de descendentes era praticamente zero. Na fase seguinte da vida, parte deles não consegue dar seguimento ao crescimento. Temos aí, no mínimo, uma população de metade do que era antes [do acidente]", conta um dos pesquisadores.
Segundo Flávio Lima, coordenador do projeto Cetáceos da Costa Branca, da Universidade Estadual do Rio Grande do Norte (UERN) , já está claro que o prejuízo extrapolou o mal causado aos animais atingidos na época. "Nós podemos ver, como impacto mais duradouro, os danos a ambientes mais sensíveis, como os costões rochosos e as franjas de manguezais. Ainda há fragmentos nessas áreas, assim como também nas praias mais impactadas o óleo ficou soterrado. De forma prática: há uma contaminação sistêmica desde as fontes de de nutrientes, isso atingiu toda a cadeia alimentar, representando uma contaminação sistêmica de algas e outros microorganismos e vegetais", diz.