ONU: Brasil rejeita investigação sobre Amazônia e direitos humanos
"O Brasil não vai se submeter à tutela politizada", diz embaixadora do Brasil na ONU

Foto: Violaine Martin/UN Photo
O Brasil se recusou nesta segunda-feira (21), a aceitar que o Conselho de Direitos Humanos da ONU realize um debate sobre a crise na Amazônia e se opõe a qualquer tipo de investigação internacional contra o país. "O Brasil não vai se submeter à tutela politizada, disfarçada de um mandato técnico", declarou a embaixadora do Brasil na ONU, Maria Nazareth Farani Azevedo.
A diplomata respondeu ao fato de que, pela primeira vez em seu período democrático, o Brasil foi alvo de uma recomendação oficial para que o governo seja objeto de uma investigação internacional por suas políticas ambientais e de direitos humanos. De acordo com o relator especial da ONU, Baskut Tunkat, responsável pelos temas de gestão ambiental e resíduos tóxicos, a proposta é de que o Conselho de Direitos Humanos aprove a abertura de uma investigação. Tunkat concluiu seu mandato em meados do ano e o informe foi apresentado pelo novo relator, Marcos Orellana.
Segundo a coluna de Jamil Chade no UOL, o pedido reflete uma crise sem precedentes entre o governo brasileiro e os enviados independentes da organização. O ataque do governo brasileiro à ONU ocorre às vésperas da abertura do Assembleia Geral das Nações Unidas por parte do presidente Jair Bolsonaro, na terça-feira (22), e amplia o mal-estar entre o país e a instituição internacional.
Covid-19
Segundo o documento, é provável que o Brasil tenha violado obrigações legais devido a posturas negacionista ao desmontar sistemas de proteção aos grupos mais vulneráveis durante a pandemia da Covid-19, doença causada pelo novo coronavírus.
Marcos Orellana, atualmente novo relator da ONU, disse em discurso nesta segunda-feira (21), que a abertura de um inquérito era necessário diante dos ataques contra o meio ambiente e direitos humanos que continuam no Brasil. "O país foi por muitos anos uma liderança. Mas, tristemente, está em uma regressão profunda", disse.
Segundo ele, sem um controle, a situação no Brasil não será apenas uma calamidade ao país, mas uma ameaça global. O relator, portanto, voltou a recomendar que Conselho abra um inquérito e que uma sessão especial sobre proteção à Amazônia seja realizada.
De acordo com a embaixadora, o relator "subestima os esforços do Brasil para dar uma resposta ao desmatamento, adotando regulamentamos ambientais rigorosas". Segundo ela, a operação Brasil Verde Número 2 é prova do "compromisso do governo" para punir crimes ambientais e combater incêndios.
O governo indicou que, até agosto, multas ambientais chegaram a US$ 75 milhões e 20 mil inspeções foram feitas na região de floresta. Em discurso, o governo disse ainda, os dados do relatório eram incompletos e que autoridades estabeleceram leis que impedirão novas barragens como a de Brumadinho, além de novas regras sobre construções nas proximidades desses locais.
Entidades criticam governo
O discurso do Brasil foi alvo de críticas. Naiara Bittencourt, assessora jurídica da Terra de Direitos e integrante da Campanha Permanente contra os Agrotóxicos e pela Vida, disse que "não é possível afirmar, como fez o governo brasileiro, que temos uma forte legislação de proteção ambiental".
"Só no caso de agrotóxicos, não são poucos os instrumentos de flexibilização que avançaram amplamente nos últimos anos, como é o caso das Resoluções Colegiadas da ANVISA de 2019 que alteram a classificação toxicológica dos agrotóxicos ou mesmo da Portaria 43/2020do MAPA que visava o registro "tácito de agrotóxicos", disse.
"Somente neste governo tivemos o registro de 767 produtos, muitos destes proibidos na União Europeia", apontou.
"Esperava-se do governo brasileiro que trouxesse dados e elementos concretos que contrapusesse os dados de envenenamento da população por agrotóxicos. No mesmo sentido, o governo não foi capaz de contestar as recomendações elencadas, demonstrando o que tem feito para garantir a saúde e segurança da população contra a aprovação desenfreada de agrotóxicos. Desqualificar o documento, acusando-o de político ou questionando o seu inegável caráter técnico, é uma maneira equivocada que apenas demonstrar a falta de compromisso do governo com direitos humanos das populações afetadas, especialmente agricultores familiares, trabalhadores rurais, indígenas e quilombolas", completa Naiara.