Sara Winter revela que partiu do Planalto a orientação de atacar o STF durante o 'Acampamento dos 300'
Ativista também afirma que parlamentares orientavam o rumo do discurso dos extremistas

Foto: Reprodução/Redes Sociais
A ativista Sara Winter, 29 anos revelou, em entrevista à ISTOÉ, detalhes das articulações do “Acampamento dos 300”, instalado em maio de 2020, em Brasília. Ela contou que parlamentares, ministros e o presidente Bolsonaro orientavam os militantes no ataque à imprensa, ao Supremo Tribunal Federal (STF) e ao então presidente da Câmara Rodrigo Maia.
No brechó da mãe, em São Carlos (SP), continua mantendo o argumento de que o acampamento surgiu a partir de "um surto da Sara e do Osvaldo Eustáquio que se transformou numa histeria coletiva”. No entanto, ela ressalta que os parlamentares Daniel Silveira (PTB-RJ), Carla Zambelli (PSL-SP), Sargento Fahur (PSL-PR) e Bia Kicis (PSL-DF) foram muito presentes na organização, além do ministro-chefe do Gabinete de Segurança, general Augusto Heleno.
De acordo Sara, a deputada Carla Zambelli era a parlamentar que mais participava e também a que passava mais informações sobre a repercussão do acampamento. Foi Zambelli quem orientou para que o alvo dos protestos fosse Rodrigo Maia, afirma Winter.
Já a deputada Bia Kicis tinha a função de organizar o acampamento. “Ela ensinou a gente como chamar atenção da imprensa”, afirma Sara. A estrutura para isso ficou a cargo da própria parlamentar: “Ela cedeu o assessor Evandro Araújo e colocou um advogado de seu gabinete para acompanhar reuniões com a Secretaria de Segurança do Distrito Federal”. Foi isso que permitiu que o “Acampamento dos 300” continuasse por quase um mês.
Sara Winter afirma que o Planalto também intervinha. O ministro general Heleno a chamou até o Palácio para dar orientações. “Ele pediu para deixar de bater na imprensa e no Maia e redirecionar todos os esforços contra o STF”, disse ela.
O presidente da República, Jair Bolsonaro, tinha influência direta sobre o grupo, conta Sara. Ela revela que o combinado foi que o mandatário não poderia ser o “protagonista para não sofrer represálias”. Certa vez, relembra Sara, o deputado Daniel Silveira fez uma chamada de vídeo com o 'blogueiro' Oswaldo Eustáquio. E Bolsonaro dizia quem o blogueiro devia investigar e subir o tom. Sara preferiu não contar os alvos do capitão: “não sei quem era”.
Apesar de falar incisivamente sobre os parlamentares e o presidente, Sara é cautelosa ao falar da ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves. As relações pessoais falam mais alto. Ambas são de São Carlos. Sara diz que as famílias se conhecem e chegou a existir um “intercâmbio de filhas”. A ativista morou com Damares e era comum a filha da ministra ficar na casa da mãe de Sara. Também foi a ministra que ensinou técnicas de palestras e deu as principais orientações ideológicas quando ela saiu da “esquerda”.
Sara afirma que a ministra orientou para que ela abandonasse o acampamento: “A Damares já sabia que eu ia ser presa e o governo a orientou a não falar mais comigo”. Elas não se falam desde 27 de maio de 2020.
A ativista não evita responder ao questionamento sobre o possível envolvimento do presidente e seus filhos com milícias. Ela afirma que se há algo a ser descoberto, o fio da meada está na Assembleia do Rio de Janeiro: “Esse tipo de assunto nunca chega a militantes como eu”.
Quanto à milícia digital, Sara conta depois após sua saída da ala bolsonarista, suas redes perderam força. Mas sabe que o boato mais comum é que deputados utilizem as emendas em esquemas para criar perfis falsos, especialmente nesse momento. “Ainda tem gente ganhando muito dinheiro com isso”, admite.
Sara está desiludida com o presidente e se diz arrependida de ter feito o acampamento. “Não tem mais como defender Bolsonaro. Mas se ele pedir para os bolsonaristas comerem merda, as pessoas vão comer”. Ela também se diz indignada com a censura dentro do bolsonarismo. “Rachadinhas e milícias são tipos de assuntos proibidos”. E ainda aponta os os filhos do presidente Carlos e Eduardo como os cães de guarda do capitão. “Quem tem destaque na direita, eles cooptam ou destroem”, diz.
A ativista graduada em relações internacionais, vive um roteiro de novela mexicana. O drama de vida traz a ministra Damares e o guru Olavo de Carvalho como base ideológica. Ela disse que sempre soube que ia ser presa, “mas nunca passou pela minha cabeça que eu ia parar num presídio”. Sara acumula uma dívida de “mais de R$ 3 milhões”, por conta dos processos.
Sara não se sente segura no Brasil. Ela afirma que o medo vem de todo o lado: “Tenho medo da esquerda, medo de um fanático e medo do governo. Em janeiro eu anunciei que eu ia contar tudo que eu sabia sobre o bolsonarismo. O Planalto surtou e fez uma reunião ministerial. A Damares foi chamada. Eu não sabia o que eles tinham tanto medo do que eu possa tornar público”.
A militante afirma que usa a imprensa como um meio para conseguir alguma proteção. E diz que planeja ir com o filho morar no México em breve.