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Um mês após novas regras, desempenho de empresas de educação na Bolsa varia com dependência de cursos EAD

Enquanto algumas empresas seguiram a trajetória de queda, outras passaram para o azul

Por FolhaPress
Ás

Um mês após novas regras, desempenho de empresas de educação na Bolsa varia com dependência de cursos EAD

Foto: Venlier Anh/Unsplash

O decreto que apertou as regras para o EAD (ensino a distância) completa um mês nesta quinta-feira (19). À época do anúncio, empresas de educação com negócios na Bolsa caíram em bloco, com o mercado adotando cautela sobre o setor enquanto pesava as novas determinações.

Passada a reação inicial, o saldo nas mesas de operação está longe de apontar para uma direção só. Enquanto algumas empresas seguiram a trajetória de queda, outras passaram para o azul - sinal de que, na visão dos investidores, cada companhia sentirá os efeitos do marco regulatório de uma forma diferente.

Representantes do setor no Ibovespa, Cogna e Yduqs são exemplo do desempenho misto.

Enquanto Cogna -dona de marcas como Somos Educação e Kroton, da universidade Anhanguera- acumulava queda de mais de 7% de valor de mercado desde o anúncio até segunda-feira (16), a Yduqs, da Estácio de Sá, subiu quase 10%.

O cenário se repete fora do índice. Vitru acumula perdas de 13%, ao passo que Cruzeiro do Sul e Ser Educacional registram altas de 17% e 20% desde o anúncio, respectivamente. A Ânima, por outro lado, ficou no zero a zero.

Para especialistas ouvidos pela Folha, o movimento difuso reflete, principalmente, o grau de exposição de cada empresa aos cursos mais afetados. O termo "exposição" remete à quantidade de alunos inscritos em graduações que deixarão de ser ofertadas em relação à base total de matriculados, bem como à representatividade desses cursos no catálogo das companhias.

Pelas novas regras, graduações de medicina, direito, odontologia, enfermagem e psicologia estão vetadas do EAD. Além disso, cursos de licenciatura (formação de professores da educação básica) deverão seguir, no mínimo, o modelo semipresencial -formato instituído pelo decreto que prevê metade da carga horária a distância e a outra metade dividida em atividades presenciais (30%) e online em tempo real (20%).

Também ficou firmado que, nos cursos EAD, 10% da carga deve ser de atividades presenciais e outros 10% de atividades presenciais ou síncronas mediadas (online, mas monitoradas em tempo real). Há ainda a obrigação de provas presenciais, que poderão ocorrer nas sedes ou nos polos.

As instituições de ensino terão dois anos para se adequar às regras. Até lá, os programas agora proibidos entrarão em um processo de descontinuação gradual e serão classificados como "extintos" em 90 dias após o decreto. Ou seja, as instituições não poderão mais matricular novos alunos nos cursos vetados do EAD a partir de 19 de agosto, e os que ingressarem até essa data estarão sujeitos a ajustes curriculares até a formatura. Os estudantes matriculados antes do decreto deverão seguir com o currículo inalterado.

"Cada empresa tem uma exposição diferente aos cursos que foram vedados do formato a distância. Medicina, enfermagem, odontologia, entre outros de saúde, exigem aulas práticas, laboratórios, estágios em hospital e por aí vai, e algumas empresas que já tinham uma infraestrutura presencial para esses cursos vão se beneficiar competitivamente", diz João Daronco, analista da Suno Research.

Exemplo disso é a Ser Educacional, de forte presença nas regiões Norte e Nordeste e que lidera as altas do setor após o decreto. A companhia detém mais de 70 unidades presenciais em todos os 26 estados e no Distrito Federal, e, nos últimos anos, investiu na abertura de novas vagas para medicina por meio de aquisições de outras instituições menores. Desde 2019, de acordo com o site oficial da empresa, foram investidos mais de R$ 900 milhões em operações de compra.

Segundo um relatório do BTG Pactual, 20% da base de alunos da Ser Educacional está em cursos que deixarão de ser ofertados na modalidade EAD, acima apenas da Yduqs (18%) e da Ânima (13%). Vitru lidera com 40% de exposição, e, por consequência, também é líder nas quedas. Cogna (37%) e Cruzeiro do Sul (28%) completam o ranking do BTG.

O caso da Cogna pode exigir mais mudanças, diz Raphael Elage, analista do setor de educação da XP. "É o exemplo mais notório, dado que ela possui cursos de enfermagem EAD, que, agora, terão de ser ofertados exclusivamente de forma presencial", afirma.

Em relatório comparando as empresas listadas no Ibovespa, a XP pontua que 8% da base de alunos do ensino a distância da Cogna está inscrita em enfermagem, versus 1% da base da Yduqs. Soma-se a isso o histórico financeiro da dona da Universidade Anhanguera, que, apesar da forte recuperação acionária de mais de 160% neste ano, ainda "sofre por conta das disrupções causadas pela pandemia", diz Daronco, citando o aumento da concorrência no EAD.

"Ainda tem a alavancagem. A Cogna tem uma dívida que, apesar de estar melhorando nos últimos trimestres, ainda é elevada e está sendo prejudicada pela alta da taxa Selic", afirma.

Já para a Yduqs, as perspectivas do analista da Suno são mais positivas: "É uma companhia que não tem tantos problemas de dívida e que tem conseguido manter uma margem estável nos últimos cinco, seis anos. Ela está um pouco mais saudável financeiramente e, com isso, consegue se adaptar melhor às mudanças do decreto."

Mas, independentemente do grau de exposição ou do nível de preparo às novas diretrizes, o decreto será custoso para as empresas -de um jeito ou de outro.

Para que a adaptação seja bem-sucedida, as empresas terão de investir em infraestrutura, quadro de funcionários, tecnologia, entre outros. Em relatório, o Itaú BBA prevê que as companhias terão de comprimir as próprias margens, caso optem por não repassar os custos com as mudanças à base de clientes. Por outro lado, se houver o repasse, é possível que o aumento na mensalidade cause uma redução no número de ingressantes.

Se as companhias absorverem 100% dos custos, haverá um impacto no Ebitda (Lucros Antes de Juros, Impostos, Depreciação e Amortização). Nos cálculos dos analistas do Itaú, o Ebitda da Vitru teria a maior compressão, a 29%, seguido por Ser Educacional (16%), Cruzeiro do Sul (14%), Cogna (13%), Yduqs (9%) e Ânima (6%).

"É muito cedo para compreender plenamente os reais impactos das mudanças. No futuro, as empresas devem desenvolver diversas estratégias para mitigar os impactos das novas regras, como implementar reajustes de preços ou concentrar as atividades presenciais em unidades ou polos específicos", pontuam. Outra possibilidade é os repasses variarem de região para região, considerando os preços praticados pela concorrência local.

Ainda assim, o arcabouço regulatório tem sido visto com bons olhos pelo setor e pelo mercado. Ele pode não ser garantia de melhora na qualidade do ensino, segundo analistas ouvidos pela Folha no mês passado, mas já é um avanço do ponto de vista de segurança jurídica e de estabilidade na oferta de programas de graduação.

"O marco deve jogar a favor das empresas no médio e no longo prazo. Apesar do impacto nos custos, ele favorece a criação de um mercado mais saudável e promove a consolidação do setor, já que as empresas menos preparadas ou 100% EAD tendem a ter uma redução, o fim da oferta de cursos ou até a fusão com outras companhias, visando a sinergia", diz Raphael Elage, da XP.

A perspectiva é compartilhada pelas empresas listadas. Em nota à Folha, o CFO (diretor financeiro, na sigla em inglês) da Yduqs, Rossano Marques, avalia que o marco regulatório visa, sobretudo, "trazer a melhor qualidade possível para o ensino na modalidade EAD".

"Dentro desse cenário, consideramos que o grupo está muito bem preparado para a nova regulação. A empresa continua gerando resultados consistentes e crescentes, com forte geração de caixa, e segue navegando muito bem, mesmo diante do atual cenário macroeconômico."

Já Jânyo Diniz, CEO da Ser Educacional, diz que a norma ajudará o setor a ter uma "oferta de cursos mais bem estruturada e com menor risco de ofertas irregulares, o que vai acabar colaborando com a demanda para instituições que fazem a oferta regular de cursos como é o nosso caso".

Ele avalia que a Ser Educacional está preparada para as novas regras, por já ter investido "fortemente" nos últimos anos em "infraestrutura, tecnologia educacional, polos bem estruturados e, sobretudo, em corpo docente qualificado".

A Ânima também acena favoravelmente ao decreto. "A qualidade acadêmica sempre foi uma diretriz inquestionável e nossas instituições e cursos já possuem, majoritariamente, padrões de qualidade adequados ao novo marco regulatório. A companhia está preparada para atender às novas exigências, demandando apenas ajustes pontuais durante o período de transição", diz a empresa, em nota.

Cogna, Vitru e Cruzeiro do Sul também foram procuradas pela reportagem, mas não retornaram até a publicação deste texto.
 

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