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Depressão masculina muitas vezes se esconde sob vício e violência, diz terapeuta

O terapeuta de família norte-americano Terrence Real defende que a depressão masculina é diferente da feminina

Por FolhaPress
Ás

Depressão masculina muitas vezes se esconde sob vício e violência, diz terapeuta

Foto: Imagem ilustrativa | Pexels

Há quase 30 anos, o terapeuta de família norte-americano Terrence Real defende que a depressão masculina é diferente da feminina e está, muitas vezes, invisível, escondida sob violência ou vício em sexo, trabalho e drogas --o que ele chama de depressão oculta, termo que ajudou a popularizar nos EUA.

"Na depressão oculta, você não vê a depressão em si. Você vê o que o homem está fazendo para tentar desesperadamente afastá-la, com automedicação e comportamentos destrutivos. Ela fica escondida, mas não é totalmente silenciosa. Há sinais, como a violência", diz Real em entrevista à Folha.

Seu principal livro, "Não Quero Falar Sobre Isso - Como Superar o Legado da Depressão Masculina", chega neste mês ao Brasil. A obra, lançada originalmente em 1997, foi pioneira ao afirmar que homens vivenciam e expressam a depressão de forma diferente das mulheres, com sinais que não se encaixam no diagnóstico clássico da doença.

"Quando escrevi este livro, ninguém falava sobre depressão masculina. A depressão era vista como uma doença feminina. E ainda hoje há pessoas que dizem que as mulheres são de duas a quatro vezes mais deprimidas", diz o terapeuta. Hoje, as especificidades da depressão em homens têm maior aceitação.

"Nem todo homem com problema de raiva, todo mulherengo, todo alcoólatra ou usuário de drogas tem depressão. Mas muitos têm --e passam despercebidos", afirma.

No livro, Real conta casos que encontrou em consultório, de famílias que estavam à beira de um rompimento total devido ao comportamento de homens que viviam com a depressão oculta.

Com histórias e informações científicas coletadas em dezenas de pesquisas, o autor explica como a doença se manifesta nesse público e quais são os possíveis caminhos para superá-la.

O autor argumenta que a cura para a depressão oculta começa com a depressão aparente. "O primeiro passo é lidar com o vício, com a raiva ou com os comportamentos destrutivos. Depois, quando a pessoa alcança um certo grau de sobriedade em relação a isso, a depressão que está por baixo começa a aparecer. Nesse ponto, é possível tratá-la com terapia e conversa."

Sobre casos que envolvem violência, Real diz que homens que representam uma ameaça também são os que precisam de ajuda. "Claro que é preciso proteger as pessoas se alguém for uma ameaça. Mas não é uma coisa ou outra. São as duas coisas ao mesmo tempo", afirma.

Segundo Real, nas mulheres, processos que levam à depressão surgem entre os 12 e 15 anos de idade; quando o patriarcado -a dominação dos homens e dos valores masculinos sobre as mulheres-- começa a atingir com mais intensidade as meninas, que precisam se submeter ao sistema e, assim, perdem a própria voz.

Nos rapazes, o processo começaria mais cedo, entre os 3 e os 5 anos de idade, de acordo com o terapeuta. Nesse período da vida, os meninos ainda têm emoções, mas sabem que não devem expressá-las. Isso acontece porque o código masculino, um conjunto de atitudes que supostamente define o que é ser homem, já exerce influência sobre os garotos.

Esse código suprime a expressão de emoções e de vulnerabilidades, segundo Real. Ele começa a aparecer quando os meninos têm os primeiros contatos com os super-heróis de aço, homens de corpo indestrutível e força sobrenatural, capazes de resolver qualquer problema e enfrentar qualquer perigo.

"Na masculinidade tradicional, a mensagem é: invulnerabilidade. Quanto mais invulnerável o homem, mais 'másculo' ele é. Quanto mais vulnerável, mais ele é visto como 'feminino' --e ser menina não é uma coisa boa, nesse código", afirma.

"Os homens negam a depressão porque isso é admitir vulnerabilidade. Mas nós somos vulneráveis. Nos conectamos uns com os outros pela vulnerabilidade, não pela força", completa.

Para o autor, a sociedade transforma meninos em homens usando a desconexão. "Ensinamos eles a se desconectarem do próprio coração, da própria vulnerabilidade e até das próprias mães. O preço da desconexão na infância é um homem desconectado", afirma.

As maneiras usadas para impor o código masculino, com ferramentas como vergonha e violência, geram traumas e feridas que, mais tarde, não tratados, vão afetar o entorno deste homem -sua família e amigos mais próximos. Eles são o que Real chama de "feridos que ferem".

"Um menino que cruza para o 'lado feminino', que mostra vulnerabilidade, chora no campo de beisebol, usa uma camisa muito colorida, é emotivo demais, sensível demais, vai despertar violência emocional e talvez até física", afirma.

Em ciclos de violência e constrangimentos, o código masculino se perpetua na sociedade e passa de pais para filhos. Para colocar um fim a essa cultura, os homens devem aprender a ser sensíveis com aqueles que amam e a ter coragem de abrir o coração para expor emoções e sentimentos --atitudes pioneiras no universo masculino.

"Você precisa cercar seu filho com uma subcultura de afeto e vínculo. Algo que funcione como uma cerca, uma barreira entre o menino e a cultura dominante", afirma. Segundo Real, os pais precisam, ao mesmo tempo, ensinar aos filhos sobre como funciona a estrutura patriarcal vigente e oferecer um espaço seguro para que os meninos possam desafiá-la.

"Quero que os pais defendam os meninos de coração aberto. Assim como seu filho pode ser zoado no parquinho por usar uma camiseta 'feminina demais', você também pode ser criticado por ser um pai de coração mole. Mas nossos filhos não precisam que a gente os endureça. O mundo já faz isso por conta própria", diz o autor.

Não Quero Falar Sobre Isso - Como Superar O Legado da Depressão Masculina
Preço: R$ 69,90 (336 págs.); R$ 46,90
Autoria: Terrence Real
Editora: Instrínseca
 

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